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CARLOS HEITOR CONY
Êxodo nacional
RIO DE JANEIRO - Devo estar defasado, ou completamente por fora do
que está acontecendo no Brasil. Ouvi,
como todo mundo ouviu, o conselho
do presidente Lula para que tiremos
o traseiro dos bancos que cobram juros altos e transportemos civicamente
o traseiro para outros bancos, onde
certamente os juros serão menores.
A totalidade da mídia tomou o
conselho presidencial como uma condenação ao comodismo nacional,
que habituou-se a sentar o traseiro
num canto e a esperar que chova dos
céus ou suba dos infernos a salvação
de nossos problemas.
Dou de barato que Lula tivesse tal
intenção, a de criticar o comodismo
de todos nós. Mas não foi por aí que
me espantei com a sua declaração.
Comodismo por comodismo, somos
comodistas desde 1500, desde o Descobrimento ou achamento do Brasil.
A primeira reportagem feita sobre o
Brasil já mencionava esse comodismo. Pero Vaz Caminha registrou que
tudo dá neste país abençoado por
Deus e bonito por natureza, desde
que "em se plantando" -uma forma
de não ser comodista.
O que me espantou na fala presidencial foi o velado cinismo em relação às taxas que todos pagamos, independentemente do lugar onde botamos o traseiro. Os juros que os bancos cobram são realmente altíssimos,
mas o governo é que os alimenta e incentiva, cobrando também seus juros, acrescidos de impostos -e somos
o primeiro ou segundo país do mundo com taxas de juros e impostos
mais altos do mundo.
Curioso: em quatro campanhas
eleitorais, nem Lula nem o PT fizeram qualquer alusão ao local onde se
deve ou não deve botar o traseiro nacional. Prometiam muitas coisas, entre as quais baixar juros e impostos.
Se ouvirmos seus conselhos de agora, acabaremos levando os traseiros
para as Ilhas Papuas, onde, segundo
consta, os juros bancários e os impostos não chegam a ser obscenos como
os nossos.
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