São Paulo, sexta-feira, 02 de maio de 2008

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TENDÊNCIAS/DEBATES

O Lula dos ventos e a tempestade dos juros

RODRIGO MAIA

O país está entrando numa grave crise e as lideranças mais qualificadas estão acuadas, sem reagir aos sinais de tempestade

COMO TODA biruta -aquele saco cônico que indica a direção dos ventos nos aeroportos-, Lula não faz opções, deixa-se levar.
E como é excelente animador de comícios (como sua ministra Dilma classifica suas falsas inaugurações diárias para aparecer no "Jornal Nacional", embora não inaugure nada), explora cada lufada favorável da economia. Celebra-as como se fosse ele que tivesse soprado. Como se a bonança das exportações, por exemplo, tivesse sido produzida pelas ações e providências do seu governo, quando ele nada teve com isso.
Seus marqueteiros criaram-lhe a imagem de Éolo, o senhor dos ventos da mitologia grega, perfeito para uma biruta: por mais que se contradiga, que celebre hoje o que condenou ontem, ninguém o contesta. Quem ousa enfrentar o deus da popularidade, reinando no alto do topo das pesquisas e comprando sem regatear as adesões políticas pelos preços que elas exigem?
Moral da história: o país está entrando numa grave crise -denunciada pelo próprio Banco Central, ao aumentar os juros em proporções que indicam profundo pessimismo- e as lideranças mais qualificadas estão acuadas, sem reagir aos evidentes sinais de tempestade.
Todos se sentem ameaçados pela feitiçaria populista e temem o risco de serem apontados como profetas da catástrofe, enquanto a biruta Lula insiste em que está tudo bem, muito bem, bem, bem. Nem indicadores extremamente populares e sensíveis -como o preço do pãozinho francês- impressionam.
Porém, enquanto os barômetros indicam a aproximação de tempestades, verifica-se que estamos absolutamente despreparados para enfrentar tais ameaças. Despreparados e imobilizados pelo conformismo.
Ou ninguém percebeu que o Banco Central elevou a taxa de juros para esfriar o ânimo do setor privado e controlar a inflação, já que o governo não faz a sua parte e o espaço para crescimento do setor privado diminui? A contabilidade nacional é inescapável.
Dado o PIB, se o governo cresce, com o avanço leonino dos gastos públicos, o setor privado é obrigado a atuar em um ambiente cada vez mais adverso.
São poucos ou mesmo inexistentes os méritos da política econômica do governo Lula para explicar o atual ciclo de crescimento, agora ameaçado.
As próprias modificações na área de crédito foram gestadas no governo de Fernando Henrique Cardoso.
Se algum mérito existe, ele reside no fato de que, além da sorte, Lula fez funcionar seu lado biruta e assumiu os ventos que não soprou. Em poucas ocasiões houve uma conjunção de fatores externos e domésticos tão favoráveis ao crescimento.
Externamente, a fase áurea de crescimento mundial, que agora parece se esvair. Internamente, destacam-se os bons fundamentos deixados pelo governo anterior. Essa história de herança maldita não passa de um mito utilizado em discursos políticos do PT e de seus aliados. Melhor seria chamá-la de herança bendita.
Já a economia mundial favorece a economia doméstica pelo aumento da procura por produtos brasileiros de exportação em quantidades físicas que impulsionam os preços das commodities. O Brasil se beneficia como grande produtor de bens primários (como soja, açúcar e minério de ferro) demandados pelo resto do mundo.
A fase áurea de crescimento mundial (que eleva também a demanda por produtos semi e manufaturados) foi a grande responsável pelo "boom" de crescimento das exportações.
O espetacular crescimento de economias pobres e extremamente populosas, como China e Índia, significa que mais gente (muito mais gente) está ingerindo maior quantidade de calorias e proteínas diariamente.
Enquanto isso, remando contra a maré favorável, o que faz o governo Lula? Faz crescer os gastos correntes, exaurindo a capacidade de investimento do governo. Apesar de todo o alarido com o PAC, as perspectivas para a infra-estrutura produtiva do país permanecem desalentadoras, destacando-se o setor elétrico.
Nossas escolas, especialmente nos níveis fundamental e médio, continuam preparando muito mal os jovens para o mercado de trabalho. Os serviços públicos de saúde sofreram incontestável retrocesso e o déficit da Previdência cresce, gerando um grandioso e injusto passivo para ser quitado pelas gerações futuras. Não se trata de apregoar catastrofismos, mas de abandonar o conformismo com a precária fantasia lulista.


RODRIGO MAIA, 37, é deputado federal pelo DEM-RJ e presidente nacional do seu partido.

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