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Pelo método confuso
Ao salpicar concessões sem nexo, estilo de fazer política de Lula torna economia vulnerável em tempos de incerteza
OS DESAFIOS postos pela
conjuntura econômica
à política pública são
hoje de natureza distinta, e mais benigna, que os do
passado. O repique da inflação e
a reviravolta nas contas externas
são contrapartidas de um período de expansão forte e duradoura da atividade no mundo todo. O
desemprego no Brasil, para tomar a variável mais sensível,
atingiu o menor nível da década
e continua em ritmo de queda.
Administrar os efeitos colaterais da bonança que agora ameaçam, num ambiente internacional impregnado de incerteza, a
continuidade desse ciclo não é,
contudo, uma tarefa simples. Ela
não será realizada pelo método
que ficou célebre no governo Lula, o de salpicar concessões, com
freqüência contraditórias entre
si, a fim de cooptar um amplíssimo leque de grupos de interesse.
Numa rara convergência, economistas de correntes rivais puseram-se de acordo sobre a necessidade de o governo reduzir
as despesas de manutenção da
máquina pública e, aproveitando-se também da disparada na
arrecadação tributária, aumentar sua poupança para abater dívida, o superávit fiscal. Seria a
melhor maneira de ampliar a eficácia do freio que o Banco Central, por meio da elevação da taxa
básica de juros, começa a aplicar
sobre a demanda.
Mas a idéia que entrou cristalina na engenhoca de fazer política
do governo Lula -enquanto esta
produzia aumentos salariais bilionários para o funcionalismo-
saiu de lá enxertada. Transformou-se no Fundo Soberano do
Brasil. O resultado da enxertia é
uma poupança adicional modesta (meio ponto percentual do
PIB) com destinação nebulosa.
Pode ser usada para comprar dólares e investir em companhias
brasileiras fora do país; pode
abater dívida interna. Um fundo
oficialmente confuso: "híbrido",
na palavra do ministro.
Afinal, Lula desejava atender
em alguma medida a pressões
para financiar empresários brasileiros no exterior e "capitalizar" o BNDES. Queria, igualmente, satisfazer uma obsessão
do ministro da Fazenda, que
pleiteava autorização para intervir, ainda que em escala de amostra grátis, no mercado de câmbio,
uma tarefa do BC. Além disso, a
lógica política da gestão petista
não pode dispor assim facilmente de arrecadação extra, pois
sempre há uma categoria de servidores ou um pleito clientelista
na fila do sopão.
Enquanto isso, no Congresso,
senadores petistas davam a arrancada numa medida que, sob o
nobre pretexto de melhorar a
saúde pública, não só amplia
abruptamente as despesas correntes como engessa ainda mais
um Orçamento já repleto de gastos com destinação obrigatória.
Na Câmara, deputados federais
da base governista, incentivados
pelo Planalto, completavam a
obra com o projeto que ressuscita a CPMF.
Tantos desencontros de sentido nas ações do governismo e
uma crônica desarticulação de
projetos e equipes na área econômica colocam o Brasil em situação de vulnerabilidade diante
das ameaças, internas e externas,
à continuidade do crescimento.
Ainda é tempo de corrigir a rota.
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