São Paulo, segunda-feira, 02 de agosto de 2010

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Pressão cambial

Excessiva valorização do real e o retorno de capitais especulativos favorecem intervenção mais agressiva do Banco Central no câmbio

Novamente especula-se sobre a possibilidade de uma ação agressiva do Banco Central no câmbio, desta vez comprando dólares no mercado de derivativos. Os sinais típicos que antecedem esse tipo de intervenção estão presentes no cenário econômico: forte entrada de recursos externos de perfil especulativo e uma taxa de câmbio que ameaça se aproximar do que seria o limite de tolerância política do governo, R$ 1,70 por dólar.
Nesse quadro, podem-se prever para as próximas semanas tentativas do mercado de testar a firmeza de convicções do governo. A situação é difícil para o Banco Central, que já vem adquirindo dólares em volumes superiores ao fluxo de entrada no mercado à vista, sem conseguir estancar a pressão sobre as cotações. A continuidade dessa política pode esbarrar em mais dificuldades, o que levaria a autoridade monetária a atuar no mercado de derivativos, como, aliás, já deixou transparecer.
Não por acaso, o governo ameaça com novas medidas restritivas e voltam à cena declarações oficiais de que as pressões no sentido da valorização do real são passageiras e serão revertidas em algum momento com o crescimento do déficit em conta corrente. Chegou-se, portanto, ao paroxismo de contar com desequilíbrios mais acentuados na balança comercial e de serviços para sanar o problema.
O déficit externo, de fato, está crescendo. Atingiu US$ 5,2 bilhões em junho e acumula US$ 41 bilhões nos últimos 12 meses (2,1% do PIB), podendo superar US$ 50 bilhões até o fim do ano. E o padrão de financiamento externo está mudando: tem havido persistente redução no ritmo de entrada de investimento externo direto (IED). Chegou-se em junho a US$ 25,3 bilhões (1,32% do PIB), o menor valor dos últimos anos.
Mas essa escalada não tem causado impacto no câmbio, pois a contrapartida à menor entrada de IED tem sido o aumento do fluxo de capital de curto prazo (US$ 18 bilhões até agora em 2010) e do endividamento externo das empresas. Ou seja, até o momento os recursos de caráter mais especulativo e a emissão de dívidas superam a falta de IED no financiamento externo.
No mundo atual das finanças globalizadas não é surpresa que seja assim. O mercado de câmbio é determinado pelos fluxos financeiros, que são um múltiplo das transações do comércio exterior. E como os mercados financeiros são propensos a bolhas especulativas, a taxa de câmbio pode permanecer distante dos ditos "fundamentos" por muito tempo.
O fato é que o Brasil continua sendo o campeão mundial de juros a atrair capital de qualidade duvidosa. É o último "peru com farofa" no mundo à disposição do capital especulativo, para usar a expressão do ex-ministro Delfim Netto. Isso é ainda mais evidente nesse momento em que que a maior parte dos países desenvolvidos mantém suas taxas de juros próximas de zero.
A intervenção no câmbio poderá minimiza o ritmo da valorização. Mas sozinha não irá eliminá-la. Não, pelo menos, enquanto permanecerem as causas estruturais desses desequilíbrios, como a ainda reduzida corrente de comércio exterior da economia e a insuficiente poupança interna do país.


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