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Surpresa nos juros
Decisão que tirou meio ponto da taxa básica tem o mérito de mostrar capacidade de antecipação do BC e o risco de perturbar formação de preços
Não há registro, na breve história do regime brasileiro de metas
para inflação, de uma decisão do
Banco Central de baixar juros tão
surpreendente como a tomada anteontem, quando a taxa de curto
prazo da economia foi reduzida
em meio ponto percentual, para
12% ao ano. Em geral as surpresas
ocorriam no sentido contrário -o
BC era rápido e implacável no gatilho para aumentar a taxa Selic.
Explicar essa mudança pela nova composição -talvez menos ortodoxa- da diretoria do banco,
porém, seria uma atitude simplista. Tomá-la, por outro lado, como
sintoma de revés na autonomia do
BC diante das pressões políticas
do Planalto seria precipitado.
Houve uma subversão, em escala planetária, no ambiente de
exercício da política econômica
desde a eclosão da crise de 2008.
A dose cavalar de intervenção dos
governos ricos para impedir uma
depressão conquistou seu objetivo, mas produziu sequelas que se
acumulam onde quer que se olhe.
Coube às economias emergentes o papel de sustentar a atividade global. Produziram e consumiram como nunca, estimuladas pela inundação de dólares oriundos
do Fed, o BC americano.
Desde o ano passado, no entanto, esse esquema dava sinais de
exaustão. Dispararam os preços
das matérias-primas, denominados em dólares, respondendo aos
empuxos da demanda e da política inflacionária do Fed. A inflação
começou a subir em todo o mundo
emergente, e os BCs aumentaram
os juros na tentativa de refreá-la.
Até que eclodiu, em meados
deste ano, um segundo episódio
agudo de derrocada econômica
na Europa e nos EUA. A decisão do
BC brasileiro tenta reagir, em antecipação, a esse novo quadro global. Preponderou a convicção de
que a crise vai abalar a atividade
econômica no Brasil, já às voltas
com alguma desaceleração.
A vantagem do corte inesperado de juros é mostrar que o BC
também pode antecipar-se a uma
queda da atividade que vislumbra
e considera deletéria. As taxas
brasileiras, afinal, continuam as
mais altas do mundo. Não deixa
de ser saudável o BC demonstrar a
conhecidos arautos das finanças
algum distanciamento.
Os riscos, contudo, não são desprezíveis. O principal deles é que a
inflação ainda não baixou. A alta
dos preços que respondem, sobretudo, ao mercado interno -pouco
afetados pela crise internacional- está em 9% ao ano. A ousadia do BC brasileiro deveria continuar, portanto, apenas até o ponto em que não ameace desorganizar o dispositivo de formação de
preços no país, hoje ancorado no
sistema de metas de inflação.
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