São Paulo, sexta-feira, 02 de setembro de 2011

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Surpresa nos juros

Decisão que tirou meio ponto da taxa básica tem o mérito de mostrar capacidade de antecipação do BC e o risco de perturbar formação de preços

Não há registro, na breve história do regime brasileiro de metas para inflação, de uma decisão do Banco Central de baixar juros tão surpreendente como a tomada anteontem, quando a taxa de curto prazo da economia foi reduzida em meio ponto percentual, para 12% ao ano. Em geral as surpresas ocorriam no sentido contrário -o BC era rápido e implacável no gatilho para aumentar a taxa Selic.
Explicar essa mudança pela nova composição -talvez menos ortodoxa- da diretoria do banco, porém, seria uma atitude simplista. Tomá-la, por outro lado, como sintoma de revés na autonomia do BC diante das pressões políticas do Planalto seria precipitado.
Houve uma subversão, em escala planetária, no ambiente de exercício da política econômica desde a eclosão da crise de 2008. A dose cavalar de intervenção dos governos ricos para impedir uma depressão conquistou seu objetivo, mas produziu sequelas que se acumulam onde quer que se olhe.
Coube às economias emergentes o papel de sustentar a atividade global. Produziram e consumiram como nunca, estimuladas pela inundação de dólares oriundos do Fed, o BC americano.
Desde o ano passado, no entanto, esse esquema dava sinais de exaustão. Dispararam os preços das matérias-primas, denominados em dólares, respondendo aos empuxos da demanda e da política inflacionária do Fed. A inflação começou a subir em todo o mundo emergente, e os BCs aumentaram os juros na tentativa de refreá-la.
Até que eclodiu, em meados deste ano, um segundo episódio agudo de derrocada econômica na Europa e nos EUA. A decisão do BC brasileiro tenta reagir, em antecipação, a esse novo quadro global. Preponderou a convicção de que a crise vai abalar a atividade econômica no Brasil, já às voltas com alguma desaceleração.
A vantagem do corte inesperado de juros é mostrar que o BC também pode antecipar-se a uma queda da atividade que vislumbra e considera deletéria. As taxas brasileiras, afinal, continuam as mais altas do mundo. Não deixa de ser saudável o BC demonstrar a conhecidos arautos das finanças algum distanciamento.
Os riscos, contudo, não são desprezíveis. O principal deles é que a inflação ainda não baixou. A alta dos preços que respondem, sobretudo, ao mercado interno -pouco afetados pela crise internacional- está em 9% ao ano. A ousadia do BC brasileiro deveria continuar, portanto, apenas até o ponto em que não ameace desorganizar o dispositivo de formação de preços no país, hoje ancorado no sistema de metas de inflação.


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