São Paulo, segunda-feira, 02 de outubro de 2006

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FERNANDO DE BARROS E SILVA

País dividido

SÃO PAULO - Por batida que seja, a imagem do tiro no pé é a mais branda que ocorre para ilustrar o que a campanha de Lula fez com o candidato Lula -pondo em alto risco uma reeleição que era certa. O presidente sobreviveu ao mensalão, sobreviveu à derrocada de seus principais auxiliares e parecia incólume às investidas da oposição até meados da semana passada.
A maioria pobre do país mantinha-se firme na decisão de reelegê-lo. Não foi o suposto "golpismo" da oposição, não foram tampouco a "mídia antipetista" ou a "conspiração das elites" -quem derrubou Lula na véspera da eleição foram eles: os "bons companheiros".
O partido e o aparato petista no poder entenderam os sucessivos votos de confiança dados a Lula como carta branca às mesmas práticas que haviam jogado o governo na rota da degradação. Por mais elástica que seja a tolerância popular, a anistia a Lula chegou ao limite.
Geraldo Alckmin não é figura de empolgar. O candidato que se fez porta-voz do "Brasil decente" precisou depender de uma montanha de dinheiro na campanha adversária para comover o eleitor de que mereceria passar ao segundo turno. Chegou lá pelas mãos (sujas) do PT.
Cercado de velhas raposas do mandonismo conservador, o bom moço da direita promete pôr ordem no galinheiro. Lembra um pouco aqueles personagens da obra rodrigueana, que abafam um poço de perversões sob a superfície da moral castiça e dos bons costumes.
A candidatura Alckmin vem contemplar, mais do que uma demanda ética, o moralismo tacanho de uma classe média que mistura sua justa indignação contra a corrupção com o preconceito inexpugnável em relação ao operário que ascendeu ao topo da República. O governo Lula deu pretextos para o "liberou geral" que os adversários incubavam.
Ilusão imaginar que a disputa agora plebiscitária irá jogar luz sobre problemas e soluções para o país. A divisão dicotômica entre o bem e o mal será radicalizada. A pauta é a do "pega ladrão!" contra "golpistas não passarão!".


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