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TENDÊNCIAS/DEBATES
Sem rendição, adesão ou ressentimento
JORGE BORNHAUSEN
É a única atitude digna de quem disputa uma eleição democrática. O PFL deve assumi-la pública e vigorosamente, já
HÁ OS que perdem e se rendem,
desonrados; há os que perdem
e aderem, covardes, indignos
da causa que defenderam; há os que
perdem, reconhecem realisticamente
que perderam e se recolhem ao seu
território, com humildade e altivez,
para a indispensável autocrítica, a necessária reflexão e, principalmente, a
sua própria reorganização e reestruturação de idéias e programas.
O PFL não se rende, não adere e,
sem ressentimentos, respira e reassume seu papel. Essa é a única atitude
digna de partidos que disputam eleições democráticas. Estou propondo
que o partido a assuma pública e vigorosamente, já.
Eleições democráticas não constituem nem de longe uma guerra
cruenta, que gera luto e ódio. São um
torneio de cidadãos que propõem, são
ouvidos e, recusados, se preparam para a próxima refrega -daqui a quatro
anos-, quando tentarão, de novo, ver
aceitas e experimentadas suas ideologias, propostas e programas.
Considero que a primeira providência de um partido, contados os votos, deve ser uma declaração de reconhecimento e respeito à decisão popular. Os processos eleitorais em andamento devem, no Estado de Direito
em que vivemos, ser decididos pela
Justiça Eleitoral, não nos cabendo
politizá-los.
O povo decidiu soberanamente
-usando um direito que é exclusivamente seu- ao escolher o presidente
da República. Sei que essa é uma manifestação desnecessária, mas nunca
se deve perder chances de enfatizar
que a democracia é o bem civilizatório mais importante conquistado por
uma sociedade, e, sem eleições livres
e periódicas, não há democracia.
A segunda providência deve ser crítica: como se posicionar com relação
ao novo governo?
O clima propiciatório sugere a magnanimidade do vencedor. A mão generosa estendida por interlocuções
grandiloqüentes pode representar
sincera oferta de parceria -quando
há afinidades políticas ou ideológicas- ou apenas um golpe enganador,
o canto das sereias da "Odisséia".
Nesse momento, a salvação está na
lição homérica da resistência preventiva. Tapam-se os ouvidos com a cera
da experiência, pois esses convites à
aliança visam simplesmente a cooptação; sugerem que haverá partilha
do poder, quando apenas procuram
abrir caminho para que surjam, com
suas malas, Waldomiros, Delúbios e
Marcos Valérios.
A rota da oposição só levará a uma
futura vitória eleitoral -a única que
interessa ao PFL- se a largada for
uma precisa definição de objetivos,
pontos programáticos bem definidos,
cronogramas de ações bem calculados e, principalmente, muita firmeza
para isolar, na hora em que se revelarem, os fracos, indignos, trânsfugas,
indisciplinados e individualistas, antes que suas traições -no final da jornada- comprometam a longa vigília
de trabalho e resistência. E é por aí
que devemos começar.
A propaganda -que, sintomaticamente, se convencionou chamar de
marketing político, escrachando o
que o proselitismo já não argumenta,
mimetiza o sistema de "compra e
venda"- é um capítulo que a ação
oposicionista não deve relegar à condição de providências de última hora.
Nos últimos anos, se abusou dos recursos do Estado e se montou uma indústria de factóides que, a título de divulgar atos administrativos, transformou o Palácio do Planalto numa espécie de comitê eleitoral permanente. O Estado-espetáculo se transformou em Estado circense, com evidente êxito demagógico, como foi possível conferir na campanha eleitoral.
A oposição tem de ser uma usina de
sonhos, estimuladora de projetos,
uma central de pensamento estratégico que ultrapasse a guerrilha de
oportunidades e se constitua, aos
olhos do povo brasileiro, não numa
alegoria de escola de samba para impressionar na campanha eleitoral e
que até vence eleições, como acabamos de ver, mas numa proposta consistente de felicidade, antes que o desenvolvimento, o emprego, a educação e a saúde se tornem utopias inatingíveis, como fatalmente se tornará,
dada a irresponsabilidade cruel com
que esses temas são considerados.
Os homens de pouca fé transformam as graças em ressaca, mas, para
quem tem compromissos democráticos, fim de eleição é apenas um começo de jornada. Foi com esse sentimento que acordei na manhã de 30 de
outubro, disparando telefonemas aos
companheiros, convocando-os. A democracia não conhece apocalipses,
não chegamos ao fim do mundo.
JORGE BORNHAUSEN, 69, senador pelo PFL-SC, é o presidente nacional do partido. Foi governador de Santa Catarina (1979-82) e ministro da Educação (governo Sarney) e da Secretaria de Governo da Presidência da República
(governo Collor).
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