São Paulo, quarta-feira, 02 de dezembro de 2009

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Editoriais

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A conversa de sempre

Alastra-se entre grandes partidos nacionais uma propensão a minimizar a importância de fraudes e corrupções na política

NÃO HÁ registro de um escândalo na política brasileira que tenha produzido tantas cenas explícitas de corrupção quanto o chamado mensalão do DEM no Distrito Federal.
Pacotes de dinheiro recheiam as meias, as calças, as bolsas de beneficiários; diálogos preliminares sem sentido mal disfarçam a ansiedade por botar a mão nas notas; políticos rezam após a distribuição do butim, talvez para agradecer a graça alcançada. Gravadas por um dos pivôs do esquema criminoso, essas imagens compõem alguns dos arquétipos da corrupção universal.
O Partido dos Trabalhadores, escaldado por seu próprio mensalão e pelos métodos de transportar dólares junto ao corpo, já não ataca com a voracidade de outrora os adversários flagrados em desmandos. A prudência inspirou a reação do partido ao escândalo em que se meteu o governo do DEM, gestão que era apoiada por PSDB e PPS, todas siglas de oposição ao PT.
De Portugal, um ponderado presidente Luiz Inácio Lula da Silva pregou a necessidade de observar o devido processo legal, negando que falem por si as imagens da corrupção no Distrito Federal. Lula também receitou o remédio sempre invocado em momentos assim: reforma política, com financiamento público exclusivo de campanhas.
Falta explicar por que empresas interessadas nos contratos e nas regulamentações do governo, de um lado, e autoridades corruptas, do outro, deixariam de trocar favores e dinheiro sujo se, de repente, o contribuinte se transformasse na única fonte legal de custeio dos partidos. O fundo público se tornaria apenas uma dotação complementar para quem -antes, durante e depois das eleições- está disposto a entupir-se de maços de notas.
Manifestações amenas, como a do PT, e divagações políticas, como o financiamento público, tacitamente propõem uma espécie de pacto pré-eleitoral de não agressão. Funcionaria mais ou menos assim: fica combinado que nenhuma grande sigla ataca os desmandos da outra, sob pena de pagar na mesma moeda; que desviar recursos e violar as leis, a fim de abastecer campanhas, é um mal inevitável e perdoável; que a cobertura jornalística ostensiva dos escândalos não passa de manobra midiática para conquistar público e faturamento.
A defesa hipócrita do pragmatismo criminoso emergiu de todos os escândalos recentes no país. Contra essa manifestação, deplorável sintoma do hiato entre a agenda da sociedade e a de muitos de seus representantes, a melhor resposta não é reforma política -mas investigação policial e jornalística, conscientização do eleitor na hora do voto, processos ágeis na Justiça e o fim da impunidade de quem corrompe ou é corrompido.


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