|
Próximo Texto | Índice
Editoriais
editoriais@uol.com.br
A conversa de sempre
Alastra-se entre grandes partidos nacionais uma propensão a minimizar a importância de fraudes e corrupções na política
NÃO HÁ registro de um
escândalo na política
brasileira que tenha
produzido tantas cenas explícitas de corrupção
quanto o chamado mensalão do
DEM no Distrito Federal.
Pacotes de dinheiro recheiam
as meias, as calças, as bolsas de
beneficiários; diálogos preliminares sem sentido mal disfarçam
a ansiedade por botar a mão nas
notas; políticos rezam após a distribuição do butim, talvez para
agradecer a graça alcançada.
Gravadas por um dos pivôs do esquema criminoso, essas imagens
compõem alguns dos arquétipos
da corrupção universal.
O Partido dos Trabalhadores,
escaldado por seu próprio mensalão e pelos métodos de transportar dólares junto ao corpo, já
não ataca com a voracidade de
outrora os adversários flagrados
em desmandos. A prudência inspirou a reação do partido ao escândalo em que se meteu o governo do DEM, gestão que era
apoiada por PSDB e PPS, todas
siglas de oposição ao PT.
De Portugal, um ponderado
presidente Luiz Inácio Lula da
Silva pregou a necessidade de
observar o devido processo legal,
negando que falem por si as imagens da corrupção no Distrito
Federal. Lula também receitou o
remédio sempre invocado em
momentos assim: reforma política, com financiamento público
exclusivo de campanhas.
Falta explicar por que empresas interessadas nos contratos e
nas regulamentações do governo, de um lado, e autoridades
corruptas, do outro, deixariam
de trocar favores e dinheiro sujo
se, de repente, o contribuinte se
transformasse na única fonte legal de custeio dos partidos. O
fundo público se tornaria apenas
uma dotação complementar para quem -antes, durante e depois das eleições- está disposto
a entupir-se de maços de notas.
Manifestações amenas, como a
do PT, e divagações políticas, como o financiamento público, tacitamente propõem uma espécie
de pacto pré-eleitoral de não
agressão. Funcionaria mais ou
menos assim: fica combinado
que nenhuma grande sigla ataca
os desmandos da outra, sob pena
de pagar na mesma moeda; que
desviar recursos e violar as leis, a
fim de abastecer campanhas, é
um mal inevitável e perdoável;
que a cobertura jornalística ostensiva dos escândalos não passa
de manobra midiática para conquistar público e faturamento.
A defesa hipócrita do pragmatismo criminoso emergiu de todos os escândalos recentes no
país. Contra essa manifestação,
deplorável sintoma do hiato entre a agenda da sociedade e a de
muitos de seus representantes, a
melhor resposta não é reforma
política -mas investigação policial e jornalística, conscientização do eleitor na hora do voto,
processos ágeis na Justiça e o fim
da impunidade de quem corrompe ou é corrompido.
Próximo Texto: Editoriais: Avanços no Rio
Índice
|