São Paulo, quarta-feira, 02 de dezembro de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

TENDÊNCIAS/DEBATES

A Itália aposta na América Latina

FRANCO FRATTINI


A Itália trabalha com afinco para reforçar suas relações bilaterais com o Brasil, país que está prestes a viver um momento histórico

ITÁLIA E América Latina: esta é a quarta edição da conferência nacional, um evento singular, já que une o nosso país não a outro país, mas a todo um continente. É fácil explicar o porquê dessa singularidade. A Itália e a América Latina compartilham tradições históricas, culturais, humanas e religiosas, interesses econômicos, desportivos, paixões e estilos de vida. Há aí uma profunda e sólida identidade que vai além da política.
Hoje, a relação entre a Itália e a América Latina desenvolve-se ao longo de três diretrizes que se complementam: a diretriz bilateral, a europeia e a global.
A crise econômica global não poupou a América Latina, porém encontrou, dessa vez, um subcontinente mais preparado do que no passado. A região cresceu de modo contínuo de 2003 a 2008, com taxa superior a 5%, conseguindo, também, aliviar parcialmente o peso da dívida (alguns países até se tornaram credores).
Há, portanto, condições para que a recuperação econômica em 2010 incentive a América Latina a retomar o caminho saudável dos últimos anos: uma expectativa alimentada também pelo mundo econômico italiano.
Nesse sentido, inúmeras são as histórias de sucesso -especialmente no Brasil, autêntico gigante econômico com excepcionais perspectivas de desenvolvimento.
A Itália trabalha com afinco para reforçar suas relações bilaterais com um país que está prestes a viver um momento histórico, talvez único, com a organização da Copa de 2014, da Olimpíada de 2016, o descobrimento de enormes jazidas petrolíferas "offshore" que o tornarão um exportador de hidrocarbonetos, contas públicas em ordem e um sistema econômico muito saudável, baseado, como o italiano, na economia real, que soube encontrar respostas mais eficazes para a crise do que países vizinhos.
Um país, portanto, que, por seu dinamismo econômico, mas também pela consolidada democracia política e social e pela presença da maior comunidade de origem italiana do mundo (aproximadamente 30 milhões), representa a "plataforma" natural da presença italiana na América do Sul.
Nesse contexto, merecem atenção especial as pequenas e médias empresas, com vocação para a internacionalização: colaborando com as eficientes estratégias industriais dos grandes grupos, continuam a operar no Brasil e em toda a América do Sul, levando para a área o melhor daquilo que a Itália tem, seu "made in Italy", e conseguindo superar com sucesso as dificuldades, como aquelas que vivemos nos últimos dois anos.
Existe, porém, a necessidade de um reposicionamento do nosso sistema bancário, ainda de pouca incidência na região, e justamente num momento em que as relações econômicas com os países da região têm se tornado cada vez mais amadurecidas e em pé de igualdade.
Na nossa relação com a América Latina, consideramos a dimensão europeia, isto é, o diálogo entre grandes aglomerados regionais, indispensável e complementar ao diálogo bilateral.
Uma dimensão, porém, que ainda não exprimiu todas as suas potencialidades e que poderia ser aprofundada e ampliada.
Por exemplo, é desejável que se consiga formar o apropriado consenso para que as cúpulas ALC-EU, que reúnem, a cada dois anos, chefes de Estado e de governo e ministros das Relações Exteriores de todos os países da União Europeia e da América Latina, tornem-se anuais.
Devemos, também, considerar a possível adoção de uma verdadeira estratégia plurianual da UE em relação ao subcontinente. Na próxima presidência espanhola, a Itália espera firmemente encontrar um parceiro que compartilhe essa sensibilidade.
Enfim, a América Latina tornou-se parceiro primordial na governança global. Na cúpula de Áquila, o Brasil e o México, ao lado de outros cinco países-chave de outros continentes, passaram a fazer parte de uma cooperação estruturada com os países do G8.
A criação do G20, que inclui o Brasil, a Argentina e o México, legitimou definitivamente o papel global do subcontinente. A América Latina tornou-se hoje interlocutor e parceiro indispensável no enfrentamento de todos os principais desafios internacionais, como a criação de regras para as finanças globais, a retomada das negociações de Doha, as temáticas relacionadas com o meio ambiente, a luta contra os tráficos ilegais, o terrorismo e a não proliferação de armas.
O governo italiano empenha-se, desde sempre, na busca de soluções para os desafios encontrados na singular relação que tem com a América Latina, seguindo uma orientação de política exterior amplamente compartilhada no país.
Mas, com toda a certeza, o grande empenho permanente, além da diplomacia, não pode deixar de vir do mundo empresarial, das universidades e da sociedade civil. De todos os que, de um e do outro lado do oceano Atlântico, mantêm uma ampla rede de relações, intercâmbios e projetos. Cabe a nós consolidar sempre mais, e a cada dia, essa relação.
A Itália aposta na América Latina. Uma aposta que, estou certo, não nos decepcionará.


FRANCO FRATTINI é o ministro das Relações Exteriores da Itália.

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br


Texto Anterior: Frases

Próximo Texto: Luciano Athayde Chaves: Judicialização da terceirização no setor público

Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.