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FERNANDO GABEIRA
Depois da queda
A NOVA LEGISLATURA começou e estou quase de língua
de fora. Fizemos o possível
para melhorar o nível da disputa,
conseguimos debates públicos e
compromissos dos candidatos.
Aquele clima de festa junina da última eleição desapareceu. Fui muito questionado se agora as coisas
vão ser melhores. Há algumas indicações positivas, outras que confirmam os erros do passado. Como
estou no fogo, a única certeza é trabalhar pela melhoria, em qualquer
hipótese.
No fundo, é um pouco o debate
sobre aquecimento global. Não importa se dará ou não tempo para
evitar o desastre. Em qualquer hipótese, é preciso resistir, ainda que
para ganhar alguns aninhos, quem
sabe um século.
No auge da campanha, tive de
cuidar de um grande embaraço.
Numa entrevista que ainda nem foi
publicada, há uma frase minha
ofensiva a Brasília. Imediatamente
escrevi um artigo no jornal local
pedindo desculpas e, no dia seguinte, reapresentei-as formalmente
ao governador. Jamais tive a intenção de associar a imagem da cidade,
com seu pulsar cotidiano, a escândalos políticos do passado.
No entanto foi isso que aconteceu. Pode me ajudar a dar uma virada na vida. Sempre considerei
um trabalho profissional atender
rádios, jornais, televisão e blogs. E
o tenho feito com alguma eficácia.
Percebi claramente que, para mim,
é impossível falar oito horas sem
dizer bobagens. Foram sessões de
duas horas cada uma, no curso do
meu trabalho normal.
Faltam-me condições para blindar todas as frases, impedir que se
voltem como uma flecha contra
mim. O trabalho do repórter é o
trabalho dele. É fora de propósito
esperar que telefone para você perguntando se era mesmo aquilo o
que queria dizer. Sua tarefa é redigir a entrevista, enfatizar o que lhe
parece mais atrativo para os seus
leitores.
Soou para mim a hora de mergulhar. Escreverei e vou sempre tratar com a mídia das questões essenciais. Essa intimidade diante de
um gravador e de um repórter, aparentemente, conhecedor do seu
trabalho, não vale mais para mim.
Nos Estados Unidos, há assessores
vigiando cada frase, cada silêncio,
para evitar esse desastre. Os artistas, mais soltos, gozam de uma tolerância maior, embora também
tenham de tomar os seus cuidados.
Nunca pareci tão estúpido a mim
mesmo quando vi essa frase estampada. Portanto, adeus entrevistadores de matérias "humanas".
Mesmo que isso signifique também adeus a qualquer tipo de ascensão política. No fundo, tanto as
frases estúpidas, em público, como
a ascensão política não são necessárias à minha vida.
assessoria@gabeira.com.br
FERNANDO GABEIRA escreve aos sábados nesta
coluna.
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