São Paulo, segunda-feira, 03 de março de 2008

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Compromisso histórico

MARCO VINICIO PETRELLUZZI


PT e PSDB possuem muito mais convergências do que divergências; uma aliança entre esses partidos seria de grande proveito para o Brasil


A NOTÍCIA NO sentido de que há entendimentos entre o PT e o PSDB visando à composição de chapa para a sucessão da Prefeitura de Belo Horizonte vem gerando manifestações de descontentamento por parte de alguns dos principais líderes desses partidos.
Também entre os militantes de PT e PSDB, essa possibilidade é vista com desagrado. Essa reação certamente decorre da circunstância de que, nos últimos anos, esses partidos têm sido rivais nas principais disputas eleitorais do país. Essas disputas, principalmente as de caráter regional, vêm deixando cicatrizes e rancores dificilmente assimiláveis, que acabam dificultando composições futuras.
Creio, entretanto, ao contrário, que essa possibilidade deve ser encarada com enorme entusiasmo e esperança, sempre na perspectiva de se forjar uma aliança capaz de transformar e modernizar o Brasil.
Sei bem que defender essa posição no interior desses partidos leva a desconfianças e, não raro, a manifestações contundentes de desagrado. Afinal, nos últimos anos, a tendência é a demonização dos adversários e o não-reconhecimento de seus méritos e sucessos, tudo para facilitar a tarefa de vencer as eleições seguintes.
Isso não muda o fato de que PT e PSDB encerram muito mais convergências que divergências. Ambos possuem programa de cunho social-democrata e têm, em relação ao capitalismo, visão reformista.
Quando descemos aos setores de intervenção de governo, observamos que os militantes de PT e PSDB não apresentam divergências fundamentais. O que se observa, na prática, é que na condução das áreas que eventualmente têm sob sua responsabilidade, esses militantes, até pelo histórico pessoal dos envolvidos, forjam alianças informais que acabam por superar divergências partidárias.
Sucede que, apesar das convergências, os militantes dos dois partidos tratam a possibilidade de aliança formal de forma futebolística. Não é incomum ouvir-se que se pode fazer aliança com o Diabo, desde que ela não contemple o grande inimigo PT ou PSDB. Essa tem sido a prática corrente. Além de algumas poucas alianças com partidos que efetivamente têm proximidade de pensamento ideológico, tanto PT quanto PSDB têm articulado alianças com partidos fisiológicos e conservadores que nada têm a ver com os compromissos defendidos por um e por outro.
Agora, creio que seja chegada a hora de enfrentar concretamente essa possibilidade, não apenas nas eleições locais mas, sobretudo, na oportunidade da composição dos governos e sua base de apoio. Não tenho dúvida de que um governo que tenha em sua base de sustentação o PT e o PSDB terá uma resultante expressiva e substancialmente melhor do que outro composto com as tradicionais alianças feitas por esses dois partidos.
No âmbito do Legislativo, uma aliança desse porte pode contribuir para sepultar práticas de aliciamento que envergonham a nação e acabam por forjar na opinião pública a impressão de que a ação política se traduz na mera troca de favores e cargos, no mais das vezes para a satisfação de interesses escusos.
Assim, seja no sentido de se buscar a composição de um governo de caráter social verdadeiramente avançado, seja no de enfrentar e combater a ação política meramente fisiológica, uma aliança entre PT e PSDB seria de grande proveito para o Brasil.
Nunca se deve esquecer que os partidos são apenas meios por intermédio dos quais luta-se pela concretização de idéias destinadas a conduzir a nação a destinos que contemplem o melhor para seu povo. Se olharmos para o passado veremos que boa parte dos líderes de PT e PSDB tiveram a mesma origem, forjados na luta contra a ditadura militar.
Chega mesmo a ser curioso que essas lideranças, que tantas lutas comuns travaram, em vez de admitirem uma aliança transformadora, prefiram aliar-se a partidos que acabam funcionando como verdadeiras âncoras conservadoras, impedindo o avanço que o país exige.
Forjar uma aliança entre as forças progressistas, que contemple PT, PSDB, PSB, PPS, PC do B, PDT e outros partidos que assumam um programa avançado e transformador, é a forma mais efetiva de contribuição para a arrancada do Brasil rumo ao progresso com justiça social. Nesse sentido é importante aplaudir e incentivar os entendimentos entre o governador Aécio Neves e o prefeito Fernando Pimentel. Que essa aliança possa vir a ser o embrião de um compromisso histórico, no mesmo sentido do defendido outrora pelo líder comunista italiano Enrico Berlinguer, que vise à consecução de uma política transformadora e ao resgate de práticas políticas fundadas na ética e nos princípios republicanos.


MARCO VINICIO PETRELLUZZI , 51, procurador de Justiça do Ministério Público de São Paulo, é fundador do PSDB. Foi secretário da Segurança Pública do Estado de São Paulo (1999-2002).


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