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TENDÊNCIAS/DEBATES
O PT sabe lidar com os movimentos sociais?
SIM
Uma história de luta social
EDUARDO MATARAZZO SUPLICY
O PT é um partido extremamente
preparado para lidar com os movimentos sociais porque a sua própria
história é inextricavelmente ligada à
história dos principais movimentos sociais havidos no Brasil nos últimos 25
anos. Primeiro, porque o partido foi
concebido exatamente a partir da concepção de que os trabalhadores precisariam se organizar eles próprios, com o
apoio dos mais diversos segmentos de
intelectuais, professores, profissionais
liberais e outros, para exercerem plenamente seus direitos à cidadania.
No final da década de 70, em meio ao
regime militar, cada vez mais conscientes de que, para ter efetiva voz nos destinos do país, para influenciar as decisões
de quem governava e, sobretudo, tomava decisões que afetavam profundamente a vida dos trabalhadores, era importante que estes reorganizassem a sua
forma de participação, resolvemos fundar o PT. Assim, essas forças identificaram-se com as lutas dos metalúrgicos
do ABC por justa remuneração, melhores condições de trabalho e liberdade de
organização e expressão de suas idéias.
O PT nasceu com a marca da solidariedade, como era a característica dos
fundos de greve. Também da tolerância
e do respeito às diferenças. Assim, reuniu movimentos cristãos, marxistas,
trotskistas, socialistas, humanitários, de
gênero, sempre norteado pelos princípios de defesa intransigente dos direitos
humanos. Eram em grande parte petistas os que combateram a alta do custo
de vida, no Movimento Nacional contra
a Carestia.
Por ocasião da luta pela anistia dos
que haviam sido perseguidos, torturados e cassados pelo regime militar, um
contingente enorme de petistas abraçou
a causa até que ela se tornasse vitoriosa.
Para que se restabelecessem no Brasil as
eleições livres e diretas para prefeitos
das capitais, para governadores e para a
Presidência da República, o PT constituiu-se em força pioneira e fundamental, ao lado de outras, para que o povo
saísse às ruas aos milhões a fim de expressar com toda a força o mais legítimo
anseio de liberdade e democracia.
Quando o primeiro presidente eleito
diretamente pelo povo mostrou que estava quebrando os princípios da administração pública, esteve o PT na linha
de frente para apurar os fatos e para novamente conclamar que o povo saísse às
ruas na defesa da ética na política.
Contemporâneo do nascimento do
PT é o MST, o movimento dos trabalhadores sem terra que resolveram se mobilizar para mostrar ao país a necessidade urgente de acelerar a reforma agrária. Para corrigir a brutal concentração
de renda e riqueza que caracteriza o
Brasil, é mister assentar milhões de famílias que desejam cultivar a terra e viver com dignidade no campo. Os próprios membros do MST, mesmo atuando de maneira independente do PT,
sempre souberam ver no partido o seu
parceiro solidário, que, em muitas ocasiões, foi crítico de desvios e abusos
eventualmente cometidos.
Da mesma forma, como irmãos que
nascem juntos, fundaram-se as centrais
sindicais, principalmente a Central Única dos Trabalhadores, CUT, um dos
mais fortes movimentos sociais do Brasil contemporâneo. Foi ainda o PT o
porto para o fortalecimento de tantos
movimentos organizados, como o os
das mulheres e dos negros pela igualdade de direitos.
Com essa bagagem, ao chegar aos governos, o PT tem se aberto à prática dos
instrumentos que têm visado sobretudo
a maior participação de todos nas suas
decisões, a exemplo do Orçamento Participativo, de grande relevância nos municípios. Na aplicação dos programas
sociais de transferência de renda, como
o Renda Mínima, Bolsa-Escola e Bolsa-Família -a inserção dos governos do
PT nos movimentos sociais tem feito
com que estes programas estejam continuamente sob avaliação crítica e aperfeiçoamento.
O estímulo às formas cooperativas de
produção, as práticas de bancos do povo e de microcrédito resultam também
do amadurecimento dessas proposições formuladas pelos mais diversos
movimentos sociais.
É claro que, quando se está no governo, surgem as limitações referentes à
impossibilidade de fazer tudo aquilo
que se desejaria, simultaneamente e na
extensão pela qual sempre se batalhou.
Mas aí vem a importância de dizer com
a franqueza devida aos companheiros
de tanto tempo o que é possível, abrindo-lhes todas as informações. Nem
sempre as respostas são as mais convincentes. E é natural, então, que surjam divergências, por vezes duras. Para que
não se perca a ternura e o respeito nessas ocasiões, é preciso que cada governo
se abra inteiramente para mostrar a natureza de todas as suas prioridades e limitações.
Eduardo Matarazzo Suplicy, 62, doutor em
economia pela Universidade Estadual de Michigan (EUA), senador pelo PT-SP, é professor da
Eaesp-FGV.
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