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Ocaso da tolerância
CARLOS HEITOR CONY
Rio de Janeiro - Acaso ou não, a tolerância universal está em ocaso. Tivemos recentemente a declaração enfática de FHC, que ameaçou a nação com
o limite de sua tolerância. Muita gente,
inclusive eu, descobrimos que também
chegamos ao limite da tolerância para
com o governo.
Vem agora um dos principais comandantes da Otan e declara que as
operações militares na Iugoslávia chegaram ao limite. Eles fizeram aquilo
que podemos chamar de ""dever de casa", mas não foi o bastante. Era preciso, tal como aquele óleo lubrificante,
dar um algo a mais.
No caso da Otan, que gastou uma fortuna em armamentos ditos convencionais, o limite deve ser compreendido
apocalipticamente. Os foguetes e mísseis fizeram estragos e não convenceram. Nem aos perdedores, nem aos
vencedores.
A alternativa que ficou explícita no
desabafo do valente cabo-de-guerra da
Otan, que pelo nome parece italiano, é
aquela mesma: a ""pax" americana
chegou ao limite da tolerância para
com os rebeldes que bagunçam a ordem mundial. Para eles, só resta a solução nuclear.
Merecida, por sinal. As autoridades
americanas, que comandam direta ou
indiretamente as operações da Otan,
revelaram que os atentados contra os
direitos humanos naquela região foram intoleráveis. Daí a intolerância.
No mesmo dia em que a imprensa revelou esse desabafo, mais um dossiê
contra Pinochet veio a público. No Chile, durante anos, e com a bênção e o
apoio econômico, político e militar dos
Estados Unidos, o regime de Pinochet
foi de incrível demência contra seus
adversários.
Cobrar coerência dos outros é inútil.
Conheço mil argumentos para justificar minhas próprias incoerências.
Apesar disso, sinto-me desconfortável
na companhia de FHC e da Otan, reconhecendo que a solução é a intolerância.
A diferença é que a intolerância de
um presidente e de um exército é sinistra. A minha é inútil: é a intolerância
do pescoço em relação à lâmina da guilhotina.
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