São Paulo, segunda-feira, 03 de agosto de 2009

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Crise e políticas sociais

PATRUS ANANIAS


As políticas sociais protegem o poder de compra das pessoas mais pobres, mantendo aquecido o mercado interno

CRISE VEM do grego "krísis", que significa, segundo o dicionário "Houaiss", "ação ou faculdade de distinguir". A crise financeira gerada no núcleo do capitalismo mundial avança para todos os países, com ameaças danosas para todos os setores da economia e nos impõe a todos a necessidade de fazer escolhas. A crise evidencia a crise de um modelo que precisa ser revisto, e precisamos distinguir e construir as alternativas.
No Brasil, os efeitos dessa crise foram menores em comparação com outros países em desenvolvimento e países mais desenvolvidos.
Isso se deve às boas condições macroeconômicas e às políticas sociais, que, dentre outros fatores, estão dando mais robustez ao nosso mercado interno, o que aumenta nossa capacidade de retomada de crescimento.
Elas protegem o poder de compra das pessoas mais pobres, mantendo aquecido o mercado interno, o que ajuda diretamente as pequenas economias, barrando o ciclo da crise.
Um estudo realizado pelo economista Marcelo Neri, da Fundação Getulio Vargas, publicado recentemente, mostra a crise atingindo principalmente os mais ricos: entre janeiro e abril deste ano, houve uma queda de 8,7% na renda média individual das pessoas das classes A e B nas seis principais regiões metropolitanas em comparação com o mesmo período do ano passado.
Influência da crise global, que atingiu principalmente setores que estão, direta ou indiretamente, ligados ao desempenho do mercado externo.
Por outro lado, no mesmo período, a renda média das pessoas da classe C cresceu 3,9%. A mesma parcela da população que em janeiro deste ano havia perdido para as classes D e E 11% de todo o crescimento que experimentou no governo do presidente Lula. Ou seja, foram muito menos afetados pela crise e estão com elevada capacidade de reação.
Outro estudo, organizado pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), indica que a pobreza no Brasil segue em queda, apesar da crise internacional.
Em março de 2009, a taxa de pobreza ficou em 30,7% -1,7% menor que a registrada no mesmo mês do ano anterior. Para os técnicos do instituto, o aumento real do valor do salário mínimo e a rede de garantia de renda aos pobres contribuíram decisivamente para que a base da pirâmide social não fosse a mais atingida, como ocorria em outras crises econômicas.
O dinheiro dos mais pobres é gasto aqui mesmo, alimentando o comércio local, gerando oportunidades de negócio e, consequentemente, de trabalho e renda. São recursos que dinamizam as economias locais, promovem o desenvolvimento econômico.
Mas também há algo que ainda não temos como medir com pesquisas, mas que podemos perceber conversando com as pessoas. Em uma publicação feita pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, uma reportagem mostrou a história de uma beneficiária que, com a ajuda do Bolsa Família, está conseguindo manter as filhas em cursos de informática e inglês.
As pessoas usam os benefícios para melhorar de vida, para crescer, para avançar nos seus direitos e oportunidades. Assim, quebra aquele círculo vicioso que faz a pobreza passar de uma geração para a outra.
O papel do Estado e das políticas sociais como elementos de combate à crise está entre as discussões do Simpósio Internacional sobre Desenvolvimento Social, que promoveremos em Brasília entre os dias 5 e 7 deste mês. Com o tema "Políticas Sociais para o Desenvolvimento: Superar a Pobreza e Promover a Inclusão", debateremos modelos e políticas públicas postas em prática em países da Europa, da África, da América Latina e da Ásia para promover o desenvolvimento social.
A experiência brasileira tem tido uma boa repercussão, em razão das dimensões dos programas e de seus resultados. Temos firmado acordos de cooperação com países latino-americanos, africanos e do Leste europeu, inclusive com apoio de instituições internacionais de fomento, como o Banco Mundial.
Mas temos muito a aprender. Entramos no debate com a perspectiva de promover a troca que enriquece nossa possibilidade de análise e de planejamento.
E é justamente em momentos de crise que reforçamos as condições de aprendizado e superação.


PATRUS ANANIAS DE SOUSA , 57, advogado, é o ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Foi prefeito de Belo Horizonte (1993-1996).

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br


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