São Paulo, segunda-feira, 03 de dezembro de 2007

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Novo paradigma à pacificação dos conflitos

ROGÉRIO FAVRETO


Essa política pública pretende, por meio de cursos aos operadores jurídicos, constituir um novo paradigma cultural


O BRASIL enfrenta problemas de difícil equação dentro da lógica e do respeito ao acesso à Justiça. Há um pressuposto notório de que os modelos tradicionais encontram-se significativamente esgotados para uma resposta eficaz ao universo maior e cada vez mais complexo de conflitos sociais. Entretanto, é dever do Estado implementar políticas públicas de acesso universal à Justiça brasileira.
Dentro do escopo do Pronasci (Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania), que combina ações de segurança pública com políticas sociais, a Secretaria de Reforma do Judiciário do Ministério de Justiça propõe ações voltadas à revolução democrática do direito e melhor efetivação do direito fundamental de acesso à Justiça.
Denominada Redes de Mediação, essa política pública pretende, por meio de cursos de aperfeiçoamento aos operadores jurídicos para composição e mediação de conflitos, constituir um novo paradigma cultural.
A idéia é operar com perspectiva diversa da cultura forjada pelo bacharelismo e mesmo pelo mercado de trabalho do profissional do direito no Brasil, centrada na lógica da guerra e da beligerância, e não da paz e da composição de interesses.
O profissional da guerra em que se constitui o bacharel em direito, com base formativa altamente dogmática e positivista, tem se projetado diretamente para o tecido social, fazendo com que as relações intersubjetivas e interinstitucionais se judicializem em proporções agudas, com uma perspectiva de litigância desmesurada. Poderia, em vez disso, trabalhar com a solução pacífica e negociada -portanto, mais preventiva do que curativa- dos problemas que surgem em qualquer comunidade de interesses múltiplos e diversos.
O problema aqui é realmente de aculturação à composição de conflitos, que, por óbvio, não depende tão-somente do Estado-juiz, mas de todos os agentes envolvidos numa relação jurisdicional, o que demanda um processo de reeducação dos sujeitos de direito. É com tal perspectiva que o projeto Redes de Mediação quer propor a estruturação de um processo de formação à pacificação social no âmbito das lides -judicializadas ou não.
Considerando a multiplicidade de sujeitos que quer alcançar, o projeto sugere três momentos de abordagens formativas, no campo da cognição e no das práticas profissionais voltadas à mediação e conciliação:
a) ingresso nas grades curriculares dos cursos de direito de espaços de formação no campo da mediação e composição de conflitos, articulados com os núcleos de práticas jurídicas;
b) curso de aperfeiçoamento em técnicas de mediação e composição de conflitos para os atuais profissionais do direito (magistrados, promotores de Justiça, defensores públicos, advogados públicos e particulares);
c) constituição de núcleos de Justiça comunitária voltada à formação de agentes comunitários de mediação, na perspectiva de criar meios alternativos de resolução dos conflitos.
Para tanto, a Secretaria da Reforma do Judiciário está realizando reuniões e oficinas com diversas instituições que se ocupam dessas questões, propondo uma rede de parcerias para implantação e operacionalização do projeto. Tem sido amplo o apoio à iniciativa, que busca enfrentar a atual formação jurídica conflitiva com uma política pública construída a partir da realidade social e jurídica, com fundamentação técnica e investimento do governo federal.
Por ser um projeto coletivo e de importância nacional, a participação do maior número possível de interlocutores propiciará condições para a formação de um novo paradigma voltado à pacificação social, com prevenção, controle e repressão à criminalidade associadas à preparação dos agentes do sistema de Justiça para a composição e mediação dos conflitos.


ROGÉRIO FAVRETO , procurador do município de Porto Alegre (RS), é o secretário de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça.


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