São Paulo, sexta-feira, 03 de dezembro de 2010

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Educação, um desafio para Dilma

JOÃO BATISTA ARAUJO E OLIVEIRA


No ensino fundamental, no curto prazo, são necessárias medidas eficazes de gestão e de pedagogia adequadas à condição dos professores

A falta de propostas e debates na campanha eleitoral torna imperativa a reflexão sobre a agenda da educação. Pouco se falou além de construção de creches, escolas técnicas e de genéricas menções à valorização do professor.
Embora nossos presidentes nunca tenham manifestado especial interesse pela área, PSDB e PT, partidos dos dois últimos ocupantes do Planalto, sempre a defenderam como sua bandeira.
No caso do PT, a situação é mais peculiar. Dos três ministros da pasta no governo Lula, só o atual conseguiu esboçar uma política para educação e, em grande parte, o fez sem a simpatia de parcela significativa do seu partido. Isso sugere que falta visão articulada para a área. E também significa que o primeiro desafio de Dilma Rousseff será definir quem comandará o órgão. Ao novo ministro caberá formular essa agenda, fora de apetites ideológicos, corporativistas ou clientelistas. Não é tarefa fácil. Mesmo que a opção seja pela manutenção de Fernando Haddad, que promoveu avanços importantes, a primeira grande pergunta é sua opinião sobre as propostas em curso, consolidadas sob o nome de Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE).
O primeiro passo da agenda da educação é melhorar o que está aí: o ensino fundamental, o médio e o superior. No fundamental, no curto prazo, são necessárias medidas eficazes de gestão e de pedagogia adequadas à condição dos professores.
Se valer a experiência internacional, as soluções propostas no PDE não provocarão as mudanças esperadas. No longo prazo, só há esperança se vingarem políticas para atrair jovens talentosos para o magistério, decisão que deve ser associada a estratégias adequadas de formação, estágio probatório e certificação de professores. Até lá, teremos apenas remendos.
No ensino médio, o Brasil insiste numa política equivocada, com o único intuito de preparar para o vestibular; no caso do ensino técnico, a política que vigora privilegia profissões que não existem mais e que são oferecidas por instituições incapazes de se adaptar às novas demandas do mercado.
O preparo dos alunos que chegam ao ensino médio é insuficiente para os desafios próprios desse nível. A única solução conhecida é a diversificação das modalidades desse ensino, como ocorre em quase todos os países desenvolvidos.
O ensino superior caracteriza-se pelos excessos: de alunos, de vagas, de deserção, de ineficiência, de regulamentação.
O nó górdio reside na desregulamentação: das profissões, dos currículos, dos mecanismos de credenciamento das instituições.
Todas essas mudanças esbarram nos apetites ideológicos, corporativistas e clientelistas associados à trajetória da educação no país e do próprio MEC. Restam ainda dois problemas a resolver, que, apesar da interface com o ministério, vão além de seus limites.
Um destes se refere à inserção de milhões de jovens desescolarizados e sem formação profissional, para os quais são necessárias políticas que integrem emprego, renda e formação profissional. O outro é a primeira infância.
J. Heckman ganhou o Prêmio Nobel de Economia demonstrando que o investimento mais produtivo em recursos humanos está nessa etapa da vida. Política de primeira infância não é sinônimo de creche, muito menos creche que funcione em condição precária.
Engloba política de saúde, família, assistência social, emprego, reinserção profissional das mães e cuidados com as crianças, inclusive em creches de alta qualidade.
A ambição de uma política de primeira infância deve ser a de assegurar a todas as crianças condições adequadas para atingir o seu potencial, independentemente da renda dos pais.
É por aí que se corta o círculo vicioso de reprodução da miséria e se reverte o quadro de iniquidade que caracteriza nossa história.
E agora, presidente Dilma?

JOÃO BATISTA ARAUJO E OLIVEIRA, psicólogo, doutor em educação, é presidente do Instituto Alfa e Beto. Foi secretário-executivo do Ministério da Educação (1995).

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