São Paulo, sexta-feira, 04 de fevereiro de 2011

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O apetite petista

A atual disputa por cargos no governo aponta o ímpeto renovado do petismo para retomar espaço perdido no segundo mandato de Lula

A naturalidade com que PT e PMDB falam de cargos na administração pública é de estarrecer quem não teve o senso crítico amortecido pela exibição contínua de práticas e maus costumes políticos em Brasília. A justificativa de participação nos rumos do governo se esvai com as seguidas denúncias de corrupção.
A disputa mais atual diz respeito a Furnas, empresa estatal em que o grupo político do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) é acusado pelos petistas de desmandos que teriam causado prejuízo de R$ 73 milhões, ora sob investigação do governo federal. Antes disso, a Funasa (Fundação Nacional de Saúde) e os Correios, para ficar nos casos mais recentes, já tinham sido alvo da cobiça empregatícia.
Levantamento da Folha revelou que estão sob a égide do petismo 60% dos quase 22 mil cargos de livre nomeação da Esplanada. O PMDB tem 14%, o que levou Cunha a dizer que "o periquito come milho, e o papagaio leva a fama".
"É impressionante o instinto suicida desses caras. Quem não se lembra dos aloprados?", disse Cunha, ao ver seu feudo sob ataque petista. E ameaçou: "Quem com ferro fere com ferro será ferido".
A declaração do peemedebista desvenda melhor as entranhas da política nacional do que mil discursos no Congresso. O que se vislumbra, mais uma vez, são os movimentos subterrâneos pelos quais as placas tectônicas da política brasileira se acomodam para tirar o máximo de proveito material do exercício do poder.
Quando venceu a eleição em 2002, o petismo se locupletou na máquina. O PMDB apoiara José Serra (PSDB) na eleição e teve de negociar com José Dirceu sua adesão ao governo petista.
Lula desautorizou o acordo fechado por Dirceu, mantendo o domínio do PT sobre os cargos. Passou a negociar pontualmente com peemedebistas mais maleáveis. Dois anos depois, em 2005, a insatisfação de aliados, como o PTB, levou ao escândalo do mensalão.
O cataclismo obrigou os petistas a ceder. A aliança com forças antes repelidas como retrógradas se aprofundou, alimentada pelo temor do PT de ser apeado do poder. Em 2007, no segundo mandato de Lula, o PMDB já comandava o maior orçamento da Esplanada.
Agora, o PT parece determinado a recuperar os cargos perdidos. Peemedebistas reagem ao que consideram uma traição. O apelido de "partido da boquinha", que o ex-governador fluminense Anthony Garotinho colou no petismo há 11 anos, volta à tona.
Nos próximos meses, Dilma Rousseff enfrentará as primeiras provações no Congresso, a começar pelo valor do salário mínimo. A presidente, que dá sinais de querer impor limites à voracidade partidária, cedo ou tarde terá de arbitrar entre o apetite renovado do PT e o fisiologismo tradicional do PMDB e demais aliados.


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