São Paulo, sexta-feira, 04 de fevereiro de 2011

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JOSÉ SARNEY

África 2

Na semana passada dividi com meus leitores uma meditação sobre a África, esse continente tão sofredor, onde o homem nasceu e transformou-se, na expressão de Hobbes, no seu próprio lobo.
Castro Alves dizia em versos imortais que Deus a esquecera. Ela vive agora uma nova etapa, essa despertadora. Os heróis libertários fizeram a independência, mas se tornaram ditadores e reis absolutos.
A semana foi de exacerbação da crise do Egito e extensão do processo que marcara o Norte da África e os países árabes do Oriente Médio; e Marrocos, Jordânia e Iêmen estão na fila para serem os próximos a terem seus regimes substituídos.
Uma das constatações mais importantes continua sendo que as redes sociais e as novas tecnologias se tornaram o veículo portador da chama da revolta por conseguirem, de uma maneira ou de outra, escapar da censura.
As tentativas do governo egípcio de silenciar a internet e os telefones celulares foram contornadas por provedores e grupos de voluntários fora do país e pelo movimento das associações locais, que transmitiram as palavras de ordem de boca a boca, quando não puderam utilizar os instrumentos eletrônicos.
O governo Mubarak, vendo o apoio externo seguir a dissolução da paz interna, apelou nos últimos dias para a violência. A batalha veio para as ruas e ainda pode tornar-se muito sangrenta. Na Tunísia, cerca de 200 pessoas morreram. O número talvez venha a ser maior no Egito. Quem lembra do assassinato de Anwar Al Sadat -que havia feito a paz com Israel- pela Jihad Islâmica Egípcia, quando atiraram sobre todo o corpo diplomático que acompanhava o presidente, tem ideia do que pode ser a brutalidade no país.
Outro elemento que é preciso reconhecer é que a posição de Barack Obama, que tem a iniciativa no processo de pressão dos países ricos para que a transição seja rápida, é uma confirmação do imenso erro da política liderada pelos Estados Unidos em relação aos países árabes.
No Irã, foi primeiro o apoio ao xá, depois a Khomeini, que resultaram na formação do estado islâmico, uma ditadura e uma fonte permanente de preocupação para o mundo.
Os ganhos que os EUA obtiveram nessa loucura de invadir o Iraque foi só a cabeça de Sadam Hussein, para entregar a região aos xiitas. No Líbano, deixaram o Hezbollah acabar com o regime de conciliação.
A política de manter ditadores pode resultar em novas teocracias, em lugar das sonhadas democracias islâmicas. Mas o momento é de perplexidade. Eu custo a acreditar que possam triunfar teocracias democráticas, com direitos humanos e liberdade civil.

JOSÉ SARNEY escreve às sextas-feiras nesta coluna.

jose-sarney@uol.com.br


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