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BORIS FAUSTO
Crenças duvidosas
Longe de mim duvidar dos imensos progressos da ciência médica.
Mesmo reconhecendo esse fato, convém lembrar que nem tudo é e nunca
será inteiramente conhecido. Muitas
caixas-pretas serão abertas, mas sua
quantidade é infinita.
Falando de doenças, os especialistas
têm duas respostas principais para o
imponderável dos males, sem diagnóstico claro. Ou nos dizem, em uma
afirmação realista, que no estado atual
da ciência não sabem qual o nosso
problema, ou o colocam no saco sem
fundo das viroses.
Em matéria de hábitos alimentares,
certas conclusões, seguidas às vezes de
retificação, desnorteiam o leigo: qual a
relação, por exemplo, entre o ovo e a
taxa de colesterol, ou o café e o câncer
no pâncreas? Para ser justo, não tem
tudo é impreciso: quem quiser fumar
que fume, por sua conta e risco, mas
não venha se justificar apelando para a
relatividade da ciência.
Ao mesmo tempo, há certas "descobertas" capazes de fazer especialistas e
leigos coçarem a cabeça. Vejam dois
exemplos recentes: pesquisadores
australianos, em pesquisa publicada
na revista "New Scientist", chegaram à
conclusão de que a masturbação, praticada cinco vezes por semana, desde
os 20 anos, reduz no homem, quando
chegar aos 50, o risco de contrair um
câncer na próstata. Os pesquisadores
vão além, dizendo que, para essa finalidade preventiva, a masturbação leva
vantagem sobre a relação sexual, por
evitar infecções causadas pelo contato
entre duas pessoas.
O outro exemplo está nas conclusões de uma investigação realizada pelo Instituto de Pesquisa Farmacêutica
de Milão, segundo a qual a pizza reduz
as probabilidades de câncer do esôfago, do cólon e da boca, pela presença
de uma benéfica substância oxidante
existente no tomate.
Mais uma vez, longe de mim censurar a prática masturbatória, pois já vão
longe os tempos em que era tida como
responsável pela loucura degenerativa
e outros males terríveis, como o risco
de produzir pelos na palma da mão direita, no caso dos destros. Longe de
mim também querer diminuir o infinito prazer de uma pizza bem feita, sobretudo uma pizza clássica, sem as lamentáveis invenções das bananas ou
dos agriões.
Mas é lícito duvidar dessas "descobertas", que quase sempre são contraditadas já quando surgem, ou tempos
depois, por pesquisadores presumivelmente mais sérios, embora menos
imaginosos. No caso dos dois exemplos, convém também advertir os leigos para os riscos de uma aceitação fanática do caráter profilático das "descobertas", sobretudo na dependência
da ordem sequencial de quem se lance
às práticas apontadas.
Ou seja, trocando em miúdos, o cavalheiro que se empanturrar de pizzas
e, sem aguardar uma digestão já de si
difícil, entregar-se com afinco ao prazer solitário, estará correndo o risco de
sofrer um sério distúrbio circulatório.
Por outras palavras, comilança e ato
sexual, qualquer que seja a natureza
deste, não combinam. É pelo menos o
que nos dizem os médicos, desde a
pré-adolescência. Ou será esta também uma crença duvidosa?
Boris Fausto escreve às segundas-feiras nesta
coluna.
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