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São Paulo, segunda-feira, 04 de agosto de 2003

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BORIS FAUSTO

Crenças duvidosas

Longe de mim duvidar dos imensos progressos da ciência médica. Mesmo reconhecendo esse fato, convém lembrar que nem tudo é e nunca será inteiramente conhecido. Muitas caixas-pretas serão abertas, mas sua quantidade é infinita.
Falando de doenças, os especialistas têm duas respostas principais para o imponderável dos males, sem diagnóstico claro. Ou nos dizem, em uma afirmação realista, que no estado atual da ciência não sabem qual o nosso problema, ou o colocam no saco sem fundo das viroses.
Em matéria de hábitos alimentares, certas conclusões, seguidas às vezes de retificação, desnorteiam o leigo: qual a relação, por exemplo, entre o ovo e a taxa de colesterol, ou o café e o câncer no pâncreas? Para ser justo, não tem tudo é impreciso: quem quiser fumar que fume, por sua conta e risco, mas não venha se justificar apelando para a relatividade da ciência.
Ao mesmo tempo, há certas "descobertas" capazes de fazer especialistas e leigos coçarem a cabeça. Vejam dois exemplos recentes: pesquisadores australianos, em pesquisa publicada na revista "New Scientist", chegaram à conclusão de que a masturbação, praticada cinco vezes por semana, desde os 20 anos, reduz no homem, quando chegar aos 50, o risco de contrair um câncer na próstata. Os pesquisadores vão além, dizendo que, para essa finalidade preventiva, a masturbação leva vantagem sobre a relação sexual, por evitar infecções causadas pelo contato entre duas pessoas.
O outro exemplo está nas conclusões de uma investigação realizada pelo Instituto de Pesquisa Farmacêutica de Milão, segundo a qual a pizza reduz as probabilidades de câncer do esôfago, do cólon e da boca, pela presença de uma benéfica substância oxidante existente no tomate.
Mais uma vez, longe de mim censurar a prática masturbatória, pois já vão longe os tempos em que era tida como responsável pela loucura degenerativa e outros males terríveis, como o risco de produzir pelos na palma da mão direita, no caso dos destros. Longe de mim também querer diminuir o infinito prazer de uma pizza bem feita, sobretudo uma pizza clássica, sem as lamentáveis invenções das bananas ou dos agriões.
Mas é lícito duvidar dessas "descobertas", que quase sempre são contraditadas já quando surgem, ou tempos depois, por pesquisadores presumivelmente mais sérios, embora menos imaginosos. No caso dos dois exemplos, convém também advertir os leigos para os riscos de uma aceitação fanática do caráter profilático das "descobertas", sobretudo na dependência da ordem sequencial de quem se lance às práticas apontadas.
Ou seja, trocando em miúdos, o cavalheiro que se empanturrar de pizzas e, sem aguardar uma digestão já de si difícil, entregar-se com afinco ao prazer solitário, estará correndo o risco de sofrer um sério distúrbio circulatório. Por outras palavras, comilança e ato sexual, qualquer que seja a natureza deste, não combinam. É pelo menos o que nos dizem os médicos, desde a pré-adolescência. Ou será esta também uma crença duvidosa?


Boris Fausto escreve às segundas-feiras nesta coluna.


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