São Paulo, Quarta-feira, 04 de Agosto de 1999
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O amante de Capitu

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Tornou-se um lugar-comum crítico: Machado de Assis jamais colocou em seus romances qualquer elemento autobiográfico. Recentemente, no centenário de ""Dom Casmurro", houve uma enxurrada de celebrações e estudos, a ninguém ocorreu que o caso de Capitu podia ser confessional.
Conto o que li em diários e crônicas daquele tempo, mantendo as iniciais por conveniência, há parentes vivos da pessoa em questão.
Todos sabiam da amizade filial de Machado por M. de A. -simples coincidência nas iniciais. Ao fundar a Academia, indicou-o como membro da primeira leva, o rapaz tinha então 20 e tantos anos, um único livro sem valor. Fisicamente, tinha traços de Machado, a mesma testa, o mesmo cabelo crespo, alguns tiques iguais.
Indo a um médico, por causa desses tiques, teve diagnosticada a epilepsia -doença hereditária que tanto maltratara Machado. Tão discreto quanto o autor de ""Helena", viveu na sombra, passou anos fora do Brasil. Ninguém entendia o amor que Machado tinha por ele. Ninguém entendia como os dois poderiam ser tão parecidos fisicamente.
Dos membros fundadores da Academia foi o último a morrer. Não fora a excepcional amizade de Machado, teria sido apenas um diplomata a mais.
Foram pouquíssimos os contemporâneos de Machado que notaram, nele, a mesma coincidência do filho de Capitu, que se parecia com o amante dela e não com o pai do rapaz. Há testemunhos disso: o médico Afonso Mac-Dowell, que cuidava de vários acadêmicos, e Goulart de Azevedo, que contou a história a Humberto de Campos.
Sendo verdadeira a suposição, fica encerrada a questão do adultério. O amante de Capitu era o próprio Machado.



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