São Paulo, domingo, 04 de setembro de 2011

Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Editoriais

editoriais@uol.com.br

O mapa da mina

Caderno especial sobre corrupção ajuda a dimensionar um fenômeno que não se limita à repetição de episódios circunstanciais

O projeto -tratava-se de uma rodovia em Pernambuco- já havia sido aprovado pelas autoridades. Tempos depois, percebeu-se a falha. A pista iria cruzar um lago, formado há décadas no local. Refeito o plano, a obra encareceu R$ 13 milhões.
Não foi a única irregularidade registrada naquele trecho de aproximadamente 650 km da BR-101. O governo federal pagou por serviços de drenagem que não foram realizados. O consórcio de empreiteiras responsável pela obra não instalou as estruturas de aço que deveriam dar estabilidade à pista. Os prazos para a conclusão foram estendidos, permitindo aditivos ao orçamento aprovado. A fiscalização se omitiu.
O mapa dessa mina de fraudes e desperdício aparece no caderno especial sobre corrupção, publicado hoje pela Folha. Ilustra, num caso específico e de rápida compreensão, uma prática de abusos que vai muito além do que se registra a cada escândalo especialmente clamoroso a surgir nas manchetes dos jornais.
Segundo os cálculos do economista Marcos Fernandes da Silva, da Fundação Getulio Vargas, cerca de R$ 40 bilhões se perderam com a corrupção entre 2002 e 2008. É muito: com esses recursos, o Brasil poderia reduzir em 50% o número de moradias sem saneamento básico, por exemplo.
É muito, mas não é tudo. A pesquisa incide apenas sobre as verbas federais, não levando em conta o quanto terá sido desviado dos recursos arrecadados pelos Estados e municípios.
Baseia-se, além disso, em dados da Controladoria-Geral da União, da Polícia Federal e do Tribunal de Contas da União. Ainda que nos últimos anos tenha havido um ganho na eficiência de tais órgãos, sem dúvida falta muito para que sua rede de fiscalização se estenda sobre todo o território nacional.
Feita, ainda assim, a fiscalização, desencadeadas as operações da Polícia Federal, expostos na imprensa os casos escandalosos, resta sempre a questão da impunidade. O caderno especial rememora dez escândalos -e suas dúzias de protagonistas- que, salvo exceções eventuais, estagnaram na Justiça, pulverizaram-se em tecnicalidades, dissiparam-se na prescrição.
Não é grande alívio saber que, numa comparação com outros países, o Brasil não está entre os mais desaparelhados para combater a corrupção.
Rússia e China, por exemplo, conhecem entraves à alternância de poder e à liberdade de imprensa que inexistem no Brasil. Se o descrédito da atividade política, altíssimo entre nós, tem na corrupção uma de suas maiores causas, vale ressaltar que a democracia, e o Estado de Direito, são imprescindíveis para combatê-la.


Próximo Texto: Editoriais: Vigilância ostensiva

Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.