São Paulo, sábado, 04 de novembro de 2006

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CLÓVIS ROSSI

O Carandiru aéreo

SÃO PAULO - A queda do avião da Gol causou mais mortes (154) que os 111 do Carandiru. Mas, ao contrário do que aconteceu no presídio paulista, a responsabilidade por este crime fica diluída nas dobras de um poder público imensamente ineficiente.
Primeiro, culpou-se os pilotos do Legacy, que eram estrangeiros, ainda por cima norte-americanos, os suspeitos usuais em qualquer problema que ocorra na América Latina, tenham ou não qualquer tipo de culpa.
Depois, o foco passou para os controladores de vôo. Digamos que tenham de fato errado. São culpados? Ou culpada é uma administração que forçou-os a trabalhar fora das normas e padrões internacionalmente aceitos? Fala-se de controladores que "pilotavam" 20 aviões simultaneamente, quando o limite normal é 14.
É preciso uma defensora do consumidor como Maria Inês Dolci, na Folha de ontem, para apontar o dedo para o verdadeiro culpado: "O desvio das verbas para segurança aérea, a partir de 2003, já sob o domínio do "nunca ninguém jamais". Refiro-me aos R$ 286,5 milhões efetivamente empregados no programa de proteção ao vôo até agora, dos R$ 531,7 milhões previstos para este ano".
Posto de outra forma, o governo gastou a metade do que deveria gastar para proteger a vida dos passageiros de aviões. Não consta, por exemplo, que tenha gastado só a metade do que deveria gastar para pagar os credores da dívida pública.
Natural: a vida humana, neste governo como em anteriores, vale menos que a bolsa. O pior é que, se se encontrou a caixa-preta do avião da Gol, a caixa-preta que é a forma de operar do governo no Brasil continua escondida. É preciso um Carandiru aéreo para que fiquemos sabendo que, cada vez que um avião voa pelos céus do Brasil, seus passageiros correm risco de vida.


crossi@uol.com.br

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