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FREDERICO VASCONCELOS
Muito além do caso Dantas
OS MINISTROS Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa, do
Supremo Tribunal Federal,
cada um a seu modo, têm contribuído decisivamente para a abertura do Judiciário à sociedade.
Graças a Joaquim, que quebrou o
sigilo do processo do mensalão,
soubemos que ministros da mais
alta Corte destilam preconceitos e
trocam maledicências em laptops,
e que advogados defensores de
clientes da elite monopolizam a
agenda dos tribunais para furar a
fila no julgamento de recursos.
Graças a Gilmar, o Judiciário
nunca esteve tão exposto: divergências internas vieram à tona, colocando em lados distintos magistrados, membros do Ministério
Público e da Polícia Federal, numa
pirotecnia midiática que estimula,
igualmente, manifestações de admiradores e de opositores.
O presidente do STF conta com o
apoio de notáveis da advocacia, que
apreciam sua disposição para navegar contra a corrente e vêem na
defesa do direito de defesa e no
combate às condições indignas dos
presídios um dos méritos de seu
discurso. Muitos juízes, contudo,
criticam o destempero de Mendes.
O relator do mensalão ganhou
notoriedade, entre outros motivos,
pelas discussões com pares, no Supremo, desentendimentos nos
quais, afirma, "estava defendendo
princípios caros à sociedade brasileira, como o combate à corrupção
no próprio Poder Judiciário".
É nessa seara, longe dos holofotes, que se trava uma disputa esquecida. Apesar de Mendes combater a lentidão do Judiciário, ele
não põe em julgamento um processo concluído em fevereiro em que o
MPF contesta um fato incomum:
num mesmo habeas corpus, Gilmar, que fora anteriormente voto
vencido, voltou a ser relator no julgamento de novo recurso. Atuando
como relator pela segunda vez, Gilmar foi acompanhado pela 2ª Turma do STF, trancando ação penal
contra um magistrado federal de
São Paulo que havia sido afastado,
suspeito de falsificar documento
público. (Durante esse afastamento, o substituto, hoje também sob
investigação, aplicou economias
domésticas e adquiriu dois imóveis: um apartamento no mesmo
prédio em que reside e outro num
edifício no litoral, onde também já
tinha apartamento).
Beneficiado pela decisão de Gilmar, o magistrado retornou ao cargo e, meses depois, foi denunciado
sob a acusação de outros crimes.
O futuro dirá se a pregação do
presidente do STF favoreceu o
avanço de um Judiciário menos
corporativista. A curto prazo, o cidadão que paga o salário desses
agentes públicos espera que a Justiça confirme se aquele juiz sob
suspeição merece punição ou se é
uma vítima, digamos assim, dos excessos de "independentismo" do
Ministério Público e da mídia.
FREDERICO VASCONCELOS é repórter especial.
O colunista Kenneth Maxwell está de licença.
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