São Paulo, sábado, 05 de janeiro de 2008

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MARCOS AUGUSTO GONÇALVES

Masp estatal

FURTOS de obras de arte não acontecem apenas em museus cercados de precariedades, como o Masp. Não é, portanto, "apenas" o sumiço das telas de Picasso e Portinari que justifica uma discussão acerca dos destinos do museu paulista.
O patético episódio, no entanto, não deixa de oferecer uma oportunidade para intensificar um debate que se trava aqui e ali, sem que nada de concreto aconteça. Circula pela internet um abaixo-assinado que sugere uma mudança radical do estatuto do museu. A proposta já foi firmada por nomes relevantes do meio artístico e intelectual.
O texto começa por constatar o fato de o Masp ser, há tempos, uma "instituição enferma, sem recursos e sem direção profissional".
Tal situação é atribuída ao arranjo institucional em que se inscreve o museu: "O problema a ser atacado de frente é de ordem institucional, pois, deste ponto de vista, o Masp é uma aberração: não sendo uma fundação, não dispõe de dotação original; não sendo, por outro lado, um museu do Estado, não é amparado por lei orçamentária. O mais importante museu de arte do hemisfério Sul é uma sociedade civil de direito privado, constituída por algumas dezenas de associados que não contribuem para a manutenção de sua associação".
Considerando que o patrimônio foi formado também "por um aporte oriundo da Caixa Econômica Federal, vale dizer, do Estado brasileiro", e que a sociedade em questão não parece reunir condições para arregimentar os recursos exigidos, os signatários consideram necessária uma "intervenção dos poderes públicos" que venha a colocar o Masp em sua esfera. A favor da idéia, o texto lembra casos de sucesso da gestão pública da cultura em São Paulo, como a Pinacoteca do Estado, a Osesp e o Museu da Língua Portuguesa. A senha para a mudança seria a previsão de que o prédio projetado por Lina Bardi passará à prefeitura em 12 de novembro deste ano.
A proposta soa como uma tentativa desesperada -o que é compreensível- de encerrar um ciclo de decadência. É um sinal de que a sociedade culta de São Paulo já não suporta a indigência do museu. É difícil discordar do diagnóstico, mas é também difícil imaginar como essa intervenção poderia ser realizada. Talvez Evo Morales pudesse dar uma ajuda. Na realidade, seria preciso a falência ou um gesto da sociedade que administra o Masp -o que é difícil acontecer.
Parece sensato imaginar que o museu deveria se inscrever num regime público-privado que assegurasse os meios necessários não apenas à sua preservação mas ao seu desenvolvimento. A continuar a ser gerido como nos últimos anos, o Masp, que poderia e deveria ser uma instituição de ponta, provavelmente prosseguirá em seu melancólico declínio.


MARCOS AUGUSTO GONÇALVES é editor da Ilustrada.


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