São Paulo, quarta-feira, 05 de janeiro de 2011

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HÉLIO SCHWARTSMAN

Perigos reais

SÃO PAULO - Chega janeiro e vêm as notícias sobre chuvas e acidentes nas estradas. Embora esses desastres se repitam todos os anos, continuamos lidando mal com eles.
É verdade que estão em jogo aqui forças que não controlamos. Diante de cheias tão caudalosas como as do rio Amarelo, em 1931, que custou a vida a 4 milhões de chineses -mais do que qualquer terremoto-, é até difícil imaginar quais medidas preventivas teriam ajudado. Mas o fato é que a maioria das situações não é tão catastrófica, e um pouco de antevisão bastaria para salvar vidas e reduzir prejuízos.
Não conseguimos nos sair muito bem no campo da prevenção porque nossos cérebros não foram projetados para lidar com análise de risco. Temos pavor injustificado de ameaças inexistentes em cidades, como cobras e tubarões, mas nos expomos prazerosamente a perigos reais, como viver em encostas de morros e andar em carros velozes.
Existem duas maneiras de abordar o risco. Há o modo analítico, que opera com cálculo probabilístico e lógica formal. É um sistema abstrato e lento, que exige reflexão antes de traduzir-se em ações.
Muitas vezes, simplesmente não processamos suas recomendações. Um experimento mostrou que médicos treinados erram feio. Eles julgaram uma doença que mata 1.286 pessoas de cada 10.000 -12,86%- como mais grave do que uma com taxa de mortalidade de 20%. Isso ocorre porque pessoas podem ser imaginadas, e frequências relativas expressas em porcentagem não.
O outro modo é o experiencial. Moldado por milhões de anos de seleção natural, é intuitivo, baseia-se em emoções e é rápido. Não temos de pensar antes de fugir de um leão.
O desafio é encontrar meios de ensinar o cérebro a interpretar de forma visceral informações sobre o perigo de construir em áreas inadequadas ou ignorar leis de trânsito.
Não podemos esperar milhares de anos até que nossas mentes se adaptem para temer solos arenosos ou desenvolver fobia de Ferraris.


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