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VOLUNTARISMO COMERCIAL
O economista Roberto Giannetti da
Fonseca assumiu a secretaria-executiva da Camex (Câmara de Comércio
Exterior) deixando em segundo plano a meta de exportar US$ 100 bilhões. A prioridade, declarada em entrevista à Folha, é gerar superávits de
até US$ 10 bilhões, em dois anos, independentemente dos valores absolutos de exportações e importações.
A substituição de uma meta absoluta nas exportações por uma relativa
ao saldo comercial já é um ganho de
inteligência no trato da questão em
relação à retórica que existia.
Mas logo se apresenta uma questão
de lógica. Giannetti persegue o saldo
comercial, mas repele políticas que
interfiram nas importações, receando reeditar medidas protecionistas.
Se o gestor da política comercial de
antemão rejeita medidas de substituição de importações, a conclusão lógica é que ele está novamente às voltas com metas de exportação.
Ainda é pertinente saber se o erro
do governo era apostar em vendas externas de US$ 100 bilhões ou se, além
da meta quantitativa, o erro está na
ausência de políticas comerciais e industriais mais amplas que enfrentem
de vez a questão do excesso de abertura comercial dos últimos 13 anos.
As vendas externas estão em boa
medida fora do controle do governo.
Vender no mercado mundial depende mais da taxa de crescimento da
economia internacional e ainda não
há razões para otimismo nessa área.
Infelizmente, o novo secretário da
Camex não avança um milímetro no
debate de políticas industriais mais
amplas. Pior, reafirma a velha convicção de que o mercado espontaneamente promoverá a substituição de
importações. Giannetti afirma que,
só quando houver "escala" nas exportações brasileiras, "o componente nacional vai começar a aparecer" e
que, "quando o produto final dá certo, a cadeia produtiva aparece".
É, em termos de análise de cadeias
produtivas, uma idéia de geração espontânea. Mas um saldo comercial
surge apenas se, aumentando as exportações, as importações ao menos
não cresçam na mesma intensidade.
E nada garante que as importações,
espontaneamente, percorram esse
roteiro de bom comportamento.
O secretário da Camex, porém,
acredita que, suficientemente promovidas as exportações, as cadeias
produtivas internas venham a brotar.
Outro artifício que parece promissor é a criação de novos fundos de financiamento à exportação.
É óbvio que, sem crédito farto e barato às exportações, será impossível
esperar que o saldo comercial aumente. Mas o que é uma condição
necessária nem sempre é suficiente.
Operações de crédito dependem da
qualidade dos projetos dos devedores, mas também da credibilidade da
política econômica. É quixotesco
querer salvar exportações dando crédito se as outras dimensões de uma
política industrial continuam ausentes e o governo aposta no surgimento
espontâneo de cadeias industriais.
Essa aposta choca-se frontalmente
com a noção, aceita por Giannetti, de
que é urgente gerar saldos comerciais, caso contrário haverá uma crise
de balanço de pagamentos que obrigaria o governo a frear o crescimento
da economia brasileira para enfim reduzir as importações.
Será difícil, para dizer o menos, formular políticas de comércio exterior
ancoradas numa lógica capenga. É
importante sublinhar, aliás, que aumentar os recursos disponíveis para
financiar exportações, até mesmo
com subsídios, pode ser excelente
para os grupos empresariais exportadores. Mas, sem políticas consistentes para a criação das cadeias produtivas domésticas, pode ser apenas isso,
subsídio para exportadores, sem necessariamente contribuir para a geração de saldos no comércio exterior.
A continuar desse modo, a política
oficial permanecerá ancorada no velho e infrutífero voluntarismo comercial, beneficiando os de sempre e
adiando, quando muito, uma crise de
balanço de pagamentos que o próprio gestor da Camex admite temer.
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