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Serra ou não Serra
Candidatura tucana se desfaz num jogo de bastidores alheio ao que se espera de um debate democrático moderno
DE ONDE MENOS se espera, dizia o Barão de Itararé, daí é que não sai
nada. A frase teria de
passar por algumas modificações
para aplicar-se à situação atual
do governador José Serra, que
num jantar com peessedebistas
na última terça-feira declarou
-para escassa comoção dos interlocutores- que é candidato à
Presidência da República.
Ninguém qualificaria de inesperada a atitude de Serra; de há
muito crescem as pressões da
oposição para que sua candidatura se lance em campo aberto.
No espírito do velho humorista,
seria possível entretanto dizer
que, quando muito se espera, daí
é que ninguém sai do mesmo lugar -e o aguardado anúncio da
candidatura tucana, feito entre
quatro paredes, guarnecido de
ressalvas e precauções, politicamente acrescenta pouco ao que
já estava colocado sobre a mesa,
e coisa nenhuma ao que ainda se
esconde debaixo do pano.
"Eu nunca afastei a possibilidade de ser candidato", declarou
José Serra. E repetiu, caso restassem dúvidas: "Existe a possibilidade de eu ser candidato?
Existe sim. Ela nunca foi afastada". Ao mesmo tempo, noticia-se
que aliados do paulista não excluem a eventualidade de um recuo, caso o governador de Minas,
Aécio Neves, continue recusando-se a ser vice na chapa tucana.
Em que ficamos? Qualquer
que seja o desfecho desse aborrecido drama de bastidores, a cada
dia se reduz a estatura dos personagens que o compõem. Se grandes reservas de astúcia e de cautela são necessárias a um bom
político, é também verdade que
não há liderança concebível numa atitude de permanente aversão ao risco e à clareza de compromissos.
Como é costumeiro no PSDB,
prefere-se a intriga interna ao
debate público, e acredita-se
mais na própria infalibilidade do
que na disputa franca de opiniões e de projetos.
Conforme diminui a distância
entre Serra e a petista Dilma
Rousseff, criam-se situações embaraçosas no cardinalato peessedebista. A anuência de Aécio Neves ao lugar de vice começa a ser
tratada como questão crucial para a campanha; porém, se no governador mineiro se depositam
tais esperanças de salvação, por
que não seria ele próprio o candidato à Presidência?
Natural que Aécio se faça de
rogado, enquanto os índices de
Serra desinflam nas pesquisas.
No megaevento em que se comemoraram os cem anos de nascimento de Tancredo Neves, o lema de "Aécio presidente", como
não poderia deixar de ser, foi ouvido com insistência.
Serra ou não Serra, Aécio ou
não Aécio, os nomes perdem em
importância; o que ressalta, acima de tudo, é o modo com que a
vida política no Brasil parece distante dos padrões de uma democracia moderna. De um lado, surge uma candidata inventada pelo
cesarismo presidencial; de outro,
ambições pessoais se desfazem
em picuinhas e sussurros, sem
nada de significativo a apresentar para a população.
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