São Paulo, terça-feira, 05 de agosto de 2008

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MARCOS NOBRE

Para não perder o bonde

É QUASE UM clichê dizer que eleições municipais tratam de municípios, e não de política nacional. Muitas vezes, isso aparece até como um elogio do bairro, como uma virtude de olhar para a vizinhança.
É difícil saber se isso é mesmo verdade para quem vota. Mais que isso, é difícil saber por que essa celebração do poste de iluminação seria em si mesma uma virtude.
É claro que olhar para problemas cotidianos da convivência urbana é importante. Ainda mais num país com cidades tão cheias de problemas. Mas, se for só isso, a discussão se empobrece e a política vira um torneio de inspetor de bairro.
Nenhum município é apenas assunto de quem vota nele. É assunto de todo mundo, é assunto nacional.
E "município" quer dizer coisas muito diferentes. Imaginar que uma cidade de 10 milhões de habitantes tenha problemas como os de uma cidade de 5.000 vai muito além de um elogio do bairrismo. É tolice mesmo.
Algumas cidades têm papel estratégico no desenvolvimento do país inclusive. É o caso de São Paulo. É uma cidade que tem potencial para se tornar metrópole de referência global, uma condição que poucos lugares no mundo hoje têm.
O desafio é fazer isso de uma maneira consciente, pensada. São Paulo já é metrópole de referência para a América do Sul pelo seu tamanho e pela importância econômica. Falta agora é fazer dela, com planejamento, um ponto de referência global.
Para isso, é preciso fazer o óbvio. Mas fazer o óbvio na casa dos muitos bilhões de reais. E com um planejamento de pelo menos 20 anos, com um primeiro teste importante já marcado para a Copa do Mundo de 2014.
O mais importante aqui é multiplicar o acesso a educação de qualidade em todos os níveis e a computadores e à internet. Programas de transferência de renda abrangentes são decisivos para isso. E o fomento à cultura tem de ir muito além das leis de incentivo atuais.
Para a malha de transporte ser eficiente e de qualidade, o investimento em metrô subterrâneo e de superfície, em 20 anos, tem de pelo menos igualar tudo o que já foi gasto nos últimos 40 anos. É preciso oferecer condições vantajosas para que companhias de perfil global se instalem na cidade. Facilidade de instalação e impostos decrescentes no tempo, por exemplo.
Isso mostra que fazer esse óbvio com vistas a uma inserção global também ajuda a resolver os problemas cotidianos da cidade. Faz com que o inspetor de bairro encontre o produtor de software de Seul sem ficar desconfiado.
A hora de fazer isso é agora. Porque quem perder esse bonde vai ficar só com bonde mesmo.

nobre.a2@uol.com.br


MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras nesta coluna.


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