São Paulo, terça-feira, 05 de outubro de 2004

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CARLOS HEITOR CONY

O prato de lentilhas

RIO DE JANEIRO - "Metade das empresas consultadas no Brasil, em pesquisa do Banco Mundial (Bird), informou haver pago propinas a funcionários de governo e 67,2% avaliaram a corrupção como obstáculo importante à atividade econômica. A confissão do crime por 51% das empresas pode ser a grande novidade, mas outros problemas têm maior destaque na lista das preocupações. Insegurança quanto às políticas, por 75,9%, e condições de crédito, por 71,7%."
Transcrevo nota publicada na seção de economia do "Jornal do Commercio" aqui do Rio. Em si, a corrupção reinante não chega a ser novidade no setor das empresas. Acontece que as pessoas físicas também são vítimas da engrenagem suja que prevalece na vida pública.
Para receber R$ 700 mil da desapropriação de um imóvel, um ex-colega de jornal teve de distribuir mais de R$ 400 mil em diversos estágios da burocracia, não apenas para diversas caixinhas eleitorais mas para destinatários isolados, que, de forma direta ou indireta, cobravam pedágios pelo caminho.
Tampouco a corrupção é coisa recente no mundo e no Brasil. É antiga, anterior ao prato de lentilhas com o qual Jacó subornou seu irmão em disputa pela bênção do pai. Contudo, nos últimos tempos, ela se tornou mais despudorada, atingindo um estágio quase oficial, incorporada ao orçamento de qualquer empreendimento público ou privado.
Tal como a onda de violência que sofremos, aos poucos a sociedade está se habituando com a corrupção. No caso do crime organizado, periodicamente uma batida policial desbarata uma quadrilha e prende ou mata um criminoso que bobeou em sua segurança pessoal.
De tempos em tempos, também, uma CPI consegue, com o apoio da sociedade, desmantelar um esquema sujo como o do PC Farias. Mas, olhado em conjunto, o caso que motivou o afastamento de Collor seria ridículo comparado com os esquemas até hoje existentes.


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