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Capitalismo tutelado
FHC diz que governo Lula estimula bloco de poder burocrático-corporativo; embora exagerada, sua crítica faz sentido
O EX-PRESIDENTE Fernando Henrique Cardoso provocou um debate relevante acerca
do novo "bloco de poder" que estaria sendo alimentado sob o patrocínio do governo Lula, com
traços autoritários e consequências nefastas para o país. Em longo artigo publicado no domingo
pelos jornais "O Estado de S.
Paulo" e "O Globo", o tucano começa por chamar a atenção para
as "transgressões cotidianas, o
discricionarismo das decisões, o
atropelo, se não da lei, dos bons
costumes" por parte do seu sucessor ou do governo petista.
FHC faz um inventário de atitudes e exemplos condenáveis de
Lula e nelas detecta um DNA que
"pode levar o país, devagarzinho,
sem que se perceba, a amoldar-se a um estilo de política e a uma
forma de relacionamento entre
Estado, economia e sociedade
que pouco têm a ver com nosso
ideais democráticos".
O cerne da crítica de Fernando
Henrique se volta para o que
chama de "poder burocrático-corporativo" estimulado por este
governo: aliança entre Estado,
sindicatos, movimentos sociais,
fundos de pensão e grandes empresas, "cada vez mais fundidos
nos altos-fornos do Tesouro".
"Com ajudinha do BNDES, então", ironiza o tucano, "tudo fica
perfeito". Diante de partidos
desmoralizados e da satisfação
popular com a economia, que favorecem a liderança autoritária e
personalista, estariam lançadas
as bases do que FHC chama de
"subperonismo" -alusão a Juan
Domingo Perón (1893-1974), o
caudilho que governou a Argentina em três ocasiões.
O ex-presidente carrega nas
tintas, como seria de esperar de
um líder oposicionista, e peca
por exagero ao descrever a configuração do atual governo. Sua
análise, contudo, ilumina os piores aspectos do lulismo.
Vale ressaltar que a participação do BNDES nas privatizações
e a ingerência política nos fundos de pensão estatais tiveram
início no governo FHC. Mas a
verdade é que o problema mudou de escala.
Este é um governo que vem estimulando de modo sistemático,
como se fosse uma diretriz, a
aliança entre algumas das maiores empresas privadas e grupos
de interesse aninhados no Estado e no partido. O assédio recente do Planalto sobre os investimentos e rumos da Vale é um
exemplo disso. A viabilização da
compra da Brasil Telecom pela
Oi/Telemar, que demandou mudanças legais e dinheiro do Banco do Brasil e do BNDES, é outro.
A participação do Estado na
economia brasileira ainda é excessiva. Na relação divulgada recentemente das cem maiores
empresas do país, dois terços são
de capital nacional ou misto -e,
entre essas, metade são estatais
ou tem o governo como acionista
de peso, via BNDES. Um governo
menos tentacular e corporativo e
mais orientado para as necessidades reais da população é o que
se deveria buscar. Não é para isso
que aponta o lulismo.
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