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Sombras do passado
Agravamento da insegurança econômica e do desemprego suscita atitudes protecionistas e xenofóbicas pelo mundo
O PIOR , dizem alguns
economistas a respeito
da crise mundial, ainda
está por acontecer. O
prognóstico já seria preocupante
se se limitasse apenas aos aspectos quantitativos da questão: decréscimo das atividades industriais, aumento do desemprego,
paralisia do crédito.
Ocorre que também se anunciam preocupantes -embora
ainda haja tempo para coibi-los- os efeitos políticos e ideológicos da atual situação. Em meio
à onda de demissões que atinge
as principais economias do mundo, ganham nova força o nacionalismo populista e a xenofobia.
No Reino Unido, trabalhadores de uma refinaria de petróleo
realizaram uma greve contra a
admissão de empregados italianos e portugueses. Imigrantes
romenos foram demitidos em
Londres, a fim de dar lugar a ingleses, nas obras de preparação
para as Olimpíadas de 2012.
Na Itália, o governo Berlusconi
não perde oportunidade para explorar politicamente o preconceito e o racismo de parte significativa de seu eleitorado. Uma
alarmante manifestação dessa
atitude veio à tona ontem.
Por 156 votos a favor, 132 contra e uma abstenção, o Senado
italiano aprovou parte de um
projeto que criminaliza (com penas de até quatro anos de prisão)
a imigração ilegal. A lei desce a
detalhes que beiram a infâmia.
Estimula-se, por exemplo, que
médicos denunciem às autoridades os imigrantes ilegais que tiverem atendido nos hospitais.
Num estilo que lembra o fascismo, incentiva-se também a criação de "rondas" de cidadãos para
controlar a segurança nas ruas.
Ninguém desconhece o quanto
contribuíram para sustentar os
regimes totalitários da década de
1930 as angústias e os ressentimentos criados num ambiente
de insegurança econômica.
Seria precipitado, sem dúvida,
aproximar dois momentos históricos distintos. No campo mais
estritamente econômico, vem
dos anos 30, todavia, outra amarga lição -que muitos hoje aparentam ignorar.
A crise daquela década foi
agravada pela adoção de medidas
protecionistas. Buscando garantir seus níveis internos de emprego, cada país tratou de criar
barreiras às importações. O movimento acarretou quedas ainda
mais dramáticas no nível da atividade econômica global.
A demanda por mais protecionismo vai reaparecendo em toda
parte -do Senado americano a
setores da sociedade brasileira.
Trata-se de um discurso de fácil
aceitação e comprovada ineficácia. Contornar suas armadilhas
exige um esforço de coordenação
global urgente.
Épocas de crise, como se sabe,
não são propícias ao abandono
dos particularismos e ressentimentos nacionais; o quadro já é
suficientemente grave, contudo,
para que velhas sombras ressurjam a complicá-lo ainda mais.
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