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KENNETH MAXWELL
Escondidos diante de todos
UMA DAS COISAS mais estranhas sobre o jornalismo
brasileiro é o fato de que
continue a conferir credibilidade
àquilo que os jornais dos Estados
Unidos, especialmente o "New
York Times", têm a dizer sobre o
país.
Por isso, foi muito estranho estar
no Reino Unido recentemente,
poucos dias depois de ter descoberto nas páginas internas do "New
York Times" um mapa do Condado
de Devon no qual Tiverton, a antiga
cidadezinha que eu estava visitando para ver minha família, ocupava
posição proeminente. O mapa ilustrava um longo artigo sobre a caça à
raposa, ou melhor, sobre os inimigos da caça à raposa, que estavam
ocultos nos arbustos, equipados de
binóculos e câmeras, para verificar
se a organização local de caça estava obedecendo à nova lei quanto
aos esportes de sangue, que, desde
2004, proíbe a caça à raposa com o
uso de sabujos, ou pelo menos
proibiu que os cachorros façam
aquilo que são treinados para fazer
-perseguir raposas e, quando as
apanharem, matá-las.
Trata-se de um espetáculo repulsivo, com certeza. A raposa é
despedaçada pelos cães de caça.
Agora, os caçadores podem caçar,
mas os cachorros devem ser controlados, e a raposa tem de ser abatida, a tiro, de forma misericordiosa; uma espécie de compromisso tipicamente inglês, que gerou conflitos infindáveis nos campos entre
os caçadores e os defensores dos
direitos dos animais.
A correspondente do "New York
Times" havia visitado Devon para
passar o dia agachada entre os arbustos em companhia dos ativistas
que se opõem à caça, à procura dos
caçadores de raposa e de seus cães.
Foi uma visita infrutífera, ao que
parece. Mas, embora a caçada não
tivesse passado pelo local em que
ela estava postada, era necessário
escrever um artigo. E lá estava o resultado. Eu mesmo estive em Tiverton no "boxing day", o dia posterior ao Natal, no ano passado, e
vi, na velha praça do mercado, no
centro da cidade, os adeptos da caça à raposa reunidos diante do Half
Moon Inn, resplandecentes em
suas túnicas vermelhas e acompanhados de quase 300 sabujos inquietos.
Assim, caso a correspondente do
"New York Times" volte a se aventurar pelas mais recônditas regiões
de Devon, basta que visite Tiverton
no "boxing day" se quiser encontrar os caçadores escondidos diante dos olhos de todos.
Mas será que os moradores locais prestaram atenção à reportagem do "New York Times"? De maneira nenhuma.
Não estou certo de
que saibam e muito menos se importem com o que seja o "New
York Times". Uma boa lição para
os brasileiros.
KENNETH MAXWELL escreve às quintas-feiras
nesta coluna.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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