São Paulo, domingo, 06 de maio de 2007

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Censura judicial

UM DOS GRANDES avanços democráticos consagrados pela Constituição de 1988 foi a eliminação definitiva da censura da ordem jurídica do país (arts. 5º, IV, IX e 220, caput e párs. 1º e 2º). Vez por outra, porém, representantes do Poder Judiciário tentam reintroduzi-la de forma sub-reptícia.
O caso mais recente é o que envolve a biografia do cantor Roberto Carlos escrita pelo jornalista e historiador Paulo Cesar Araújo e publicada pela editora Planeta. O "rei" não gostou do texto -o que é um direito seu. Foi à Justiça -outra prerrogativa que lhe assiste- e pediu que a comercialização da obra fosse suspensa. Ignorando as disposições constitucionais contra o instituto da censura, o juiz acatou liminarmente o pleito.
A partir daí, o que se passou foi uma sucessão de pequenos atentados contra a liberdade de expressão e o direito do público à informação. Os advogados do cantor e a editora chegaram a um acordo pelo qual a obra é retirada definitivamente do mercado em troca do fim da ação judicial. O próprio autor se comprometeu a não comentar, em entrevistas, o conteúdo do livro.
Tudo isso até seria compreensível se o texto contivesse alguma grave calúnia contra o aedo. O cantor, porém, em nenhum momento referiu tal queixa. Todo o seu raciocínio jurídico baseava-se no direito à privacidade e na defesa da honra subjetiva.
Se essa linha de argumentação fizer escola, estelionatários poderão pleitear que seja proibido noticiar seus golpes e assassinos poderão requerer o veto à divulgação de seus nomes. Ninguém poderá dizer nada a respeito de outrem sem sua autorização.
O simples ato de viver em sociedade já implica uma renúncia à privacidade total. No caso de celebridades, que se nutrem da curiosidade pública, esse direito deve ser relativizado ainda mais.


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