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CLÓVIS ROSSI
A cerca e o diálogo
KÜHLUNGSBORN - É, eu também pensei, como você, o que diabo
estou fazendo em uma cidade cujo
nome nem consigo pronunciar? Se
estivesse de férias, tudo bem. Trata-se de um agradável balneário no
Báltico, extremo norte da Alemanha, e, pelo menos enquanto o verão não chega, passeiam pelas suas
calçadas "sêniores", como eu.
Acontece que estou trabalhando,
meu trabalho chama-se notícia, e a
notícia (ou os seus agentes) nem está aqui, mas em Heilingdamm, outro balneário, a 8 quilômetros, a cidade-sede, neste ano, da cúpula do
G8 (e, na sexta, do G8+5, com Lula e
seus pares da China, Índia, África
do Sul e México). Aqui fica apenas o
centro internacional de mídia.
O problema é que as cúpulas, especialmente as do G8, começaram a
ser transferidas para locais ou inacessíveis pela própria natureza ou
fáceis de cercar pela polícia de tal
forma que ninguém, a não ser seus
assessores, consegue ver os governantes.
Mesmo assim, poucos assessores:
seis por presidente entram no perímetro de segurança. Para estabelecê-lo, o governo alemão construiu
uma nova versão, mais modesta, do
Muro de Berlim, uma cerca de quase 12 quilômetros de extensão e 2,5
metros de altura. Não é para protegê-los dos jornalistas, que o mal ou
o bem que podemos fazer-lhes o fazemos (ou não) à distância mesmo.
A segregação é para protegê-los
daquela fatia dos governados que
não se conforma com o tipo de
mundo que eles comandam e, por
isso, faz manifestações toda vez que
há alguma cúpula com acompanhamento maciço da mídia.
Admito que não seria lógico permitir que George Walker Bush, hoje
o demônio preferido do planeta, levasse uma pedrada, um tiro ou coisa
pior. Mas custava convocar os grupos que não usam pedras e têm coisas importantes a dizer para conversar com os governantes? A cerca
talvez pudesse ter apenas 6 quilômetros.
crossi@uol.com.br
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