São Paulo, sábado, 06 de junho de 2009

Próximo Texto | Índice

Editoriais

editoriais@uol.com.br

Fio da navalha


Sinais incipientes de recuperação acirram o debate em torno do elevado endividamento da economia americana

A ECONOMIA dos EUA voltou a surpreender. Em maio, a redução nos postos de trabalho foi de 345 mil empregos. Os analistas esperavam um enxugamento maior, de 520 mil vagas, pouco acima do número de abril.
Como desde fevereiro persiste a tendência de quedas cada vez menores no emprego, a percepção de que a economia americana estaria no caminho de estabilizar-se ganhou força. A reputada pesquisa sobre confiança do consumidor da Conference Board registrou um salto positivo.
Diante disso, cresce nos EUA a discussão em torno das políticas monetárias -taxas de juros próximas de zero- e fiscal -o déficit público pode alcançar US$ 1,85 trilhão neste ano, equivalente a 13% do PIB- que auxiliaram na contenção da crise. Já se discute qual será o momento certo de revertê-las, ou seja, de aumentar os juros e diminuir a déficit.
Na crise, a tentativa de famílias, empresas e bancos de reduzir o endividamento, correta do ponto de vista individual, provoca forte contração no conjunto da economia. Nesses momentos de elevada aversão ao risco, apenas os governos conseguem emitir novas dívidas. Nos EUA, por exemplo, enquanto o setor privado procurou reduzir seu endividamento no quarto trimestre de 2008, o setor público foi forçado a ampliar seu passivo em 37%.
A dívida pública americana, no entanto, não pode crescer indefinidamente, sob o risco de afetar a credibilidade do Tesouro. As autoridades americanas precisam convencer o público de que as atuais políticas monetária e fiscal ultra-agressivas são temporárias e, portanto, serão revertidas. Caso contrário, poderá ocorrer uma elevação nas expectativas inflacionárias muito antes de a economia se recuperar. A alta nos juros de longo prazo poderia abortar a recuperação, introduzindo o risco da estagflação, como ocorreu nos anos 1970.
Nesta semana as autoridades americanas começaram a exercitar-se nesse equilíbrio em fio de navalha -de um lado, o risco de não sair da recessão; do outro, o de descambar em inflação.
O secretário do Tesouro, Timothy Geithner, reiterou a promessa do presidente Barack Obama de reduzir o déficit fiscal dos EUA para cerca de 3% do PIB, assim que a economia estiver num caminho de recuperação firme. O presidente do banco central, Ben Bernanke, foi mais duro: "Se não demonstrarmos um sólido comprometimento com a sustentabilidade fiscal no longo prazo, não teremos nem estabilidade financeira nem crescimento saudável".
Ambos participam de uma coreografia cujo objetivo é acalmar analistas, investidores e instituições financeiras. Reduzir abruptamente o estímulo fiscal -diminuindo o gasto público- pode provocar nova deterioração no ambiente econômico e aprofundar a retração da atividade produtiva. Mas não planejar o retorno ao equilíbrio fiscal vai alimentar a desconfiança em relação aos EUA e ao dólar.


Próximo Texto: Editoriais: Moinhos de vento na USP

Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.