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CARLOS HEITOR CONY
Biografia e biografado
RIO DE JANEIRO - Sempre ouvi
dizer que o senador José Sarney é
um homem de sorte, que nasceu virado para a Lua. Chegou à Presidência da República de forma inesperada, mas legal. E muita coisa
aconteceu com ele, provando que a
sorte sempre esteve a seu lado. É
supersticioso, entra nos aviões
sempre com o pé direito, faz sinal-da-cruz quando o aparelho sobe e
pousa, sai de um lugar pela mesma
porta da entrada, enfim, tem dado
certo para ele.
Agora mesmo, quando um tsunami invade sua praia, com a mídia
consensualmente contra a sua permanência na presidência do Senado, ele tem uma prova do quanto é
querido pelos formadores de opinião e pelos profissionais da sua
área, que é a política. Nunca um cidadão deste país teve tanta gente
preocupada com a sua biografia.
Nos últimos dias, o que mais se lê
e ouve é que Sarney tem uma biografia invejável e deve renunciar à
presidência do Senado para não
prejudicá-la. Essa preocupação
com a biografia de um político é deveras comovente (perdoem o "deveras", prometo não mais usá-lo).
Tem-se a impressão de que não
estão dando importância ao cargo,
mas à pessoa que o exerce. Para
honrar sua biografia, Sarney deveria renunciar para que a vida nacional volte à sua normalidade moral,
política e administrativa.
Acontece que Sarney tem o direito de administrar a própria biografia, que é dele, e não dos outros.
A Comissão de Ética analisará as
denúncias contra ele e encaminhará sua decisão ao plenário que o elegeu e que poderá destituí-lo da
presidência.
Para um político com a sua biografia, e que chegou ao mais alto
posto da carreira republicana, ser
mantido ou não no cargo atual é irrelevante. A renúncia seria o reconhecimento de que desmereceu de
sua biografia.
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