São Paulo, segunda-feira, 06 de outubro de 2003 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES O São Francisco de volta
FERNANDO BEZERRA
Os benefícios da obra, porém, não constituem monopólio dos nordestinos nem mesmo do castigado sertão do semi-árido. Pelo contrário, a transposição significará a queda, acentuada, das tensões sociais em centros como São Paulo e Rio de Janeiro. A diminuição dos fluxos migratórios virá acompanhada da consequente redução dos índices de desemprego, de violência e de multiplicação de favelas, frutos típicos do crescimento urbano desordenado. Não é só isso. Ninguém desconhece que o Brasil dos dias atuais se debate com agendas contraditórias. Uma, a sua face moderna, apoiada na abertura dos mercados, nas privatizações e na agenda de reformas que o presidente Lula tem proposto com vontade férrea. Outra, a face deprimida, que encontra no Nordeste a sua expressão maior, permanece atrelada ao século 19, como se estivesse irremediavelmente condenada ao fracasso. Essa é uma realidade de aparência, que pode mudar de forma radical se a seca for banida do cotidiano e a região puder se integrar, em definitivo, ao Brasil moderno, aquele que prospera e se aproxima da qualidade de vida da comunidade internacional. Quando deixei o Ministério da Integração Nacional, faltava apenas o Congresso aprovar o orçamento inicial da obra e vencer resistências localizadas, ditadas menos por questões substantivas do que pelo desconhecimento do verdadeiro sentido do projeto. Algumas sugestões procedentes, como o desvio das águas do rio Tocantins para o São Francisco, em nada iriam obstar o andamento do projeto. Assim, o Nordeste -a região do semi-árido, para ser exato- poderia superar um dos capítulos mais dolorosos da sua historia, feito da triste combinação da seca com o êxodo rural, e voltar ao presente na plenitude da sua capacidade realizadora. O que é absolutamente possível e, de qualquer ângulo que se olhe, inadiável. Uma obra de tal magnitude é para o início de um governo. Deixá-la para mais tarde é condená-la ao fracasso, mais uma vez, desde que D. Pedro 2º determinou os primeiros estudos, em 1852, afirmando que a obra era tão importante que, se necessário, venderia as jóias da própria Coroa para financiá-la. De lá para cá mudamos de regime, tivemos inúmeros governos, todos eles comprometidos, em princípio, com a sua realização; mas o projeto não se concretizou. Quem sabe o destino tenha reservado a um presidente nordestino, que viu e sentiu a dureza da miséria e da fome na sua infância, a missão de ter sucesso onde todos os outros fracassaram. Em isso ocorrendo, o presidente Lula, independentemente do que aconteça com o seu governo, passará para a historia como o presidente que, com a transposição das águas do rio São Francisco, arrancou da pobreza milhões de brasileiros comprometidos com sua terra, que desejam ardentemente produzir, gerar empregos e criar riquezas como os seus irmãos do Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Fernando Bezerra, senador pelo PTB-RN, é vice-líder do governo no Senado. Foi ministro da Integração Nacional (governo Fernando Henrique Cardoso). Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Flávia Piovesan e Silvia Pimentel: Aborto, Estado de Direito e religião Índice |
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