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ANTONIO DELFIM NETTO
Política monetária e obstetrícia
A nota da 153ª reunião do
Comitê de Política Monetária
do Banco Central (Copom)
tenta mostrar as razões pelas
quais a Selic foi mantida em
10,75% ao ano, contrariando
as sugestões da maioria dos
fundamentalistas do mercado. Foi, por isso, duramente
criticada com a acusação de
que tal comportamento comprometeria a enorme credibilidade do Banco Central.
Na contramão dessa história, temos a convicção de que
a decisão do Banco Central e a
sua justificativa constituem
um verdadeiro ponto de inflexão da política monetária. Pela primeira vez admitiu-se, explicitamente, que todos os
modelos que a orientam são
sujeitos a importantes incertezas. Exigem o conhecimento
de parâmetros (que são variáveis!) que não são diretamente
observáveis. Isso impõe menos arrogância e mais cuidado ao seu executor.
É exatamente esta dúvida
saudável que constitui o ponto de inflexão: um ataque de
lucidez baixou, subitamente, no novo Copom.
Essa convicção se reafirma
na leitura do "Relatório de Inflação do Banco Central" (setembro de 2010, vol. 12, nº 3).
Suas páginas 94-103 exploram com maior profundidade
o problema da "Taxa de Juros
Real de Equilíbrio", ou "Taxa
Neutra". O enfoque é cuidadoso. Não se compromete com
uma definição mais explícita:
por exemplo, a taxa de juro
real que manteria a economia
no nível de plena utilização de
sua capacidade sem acelerar a taxa de inflação.
Ela é definida como o resultado do equilíbrio num "modelito" de oferta e procura globais, fechado por uma equação "de estrutura a termo da
taxa de juros" nominal. A solução analítica é interessante,
mas o resultado numérico encontrado pelo Banco Central é
cuidadosamente escondido
(até os gráficos não têm escala). Qual essa taxa? E qual seu
"intervalo de confiança"? Mistério do Templo!
Somos consolados com
uma conclusão (duvidosa):
"Embora seja plausível afirmar que a taxa de juros real de
equilíbrio ainda se encontra
em níveis superiores às observadas na maioria dos países
listados, as evidências aqui
apresentadas suportam a visão de que ela recuou nos últimos anos". Ela confirma que,
nos últimos 6 ou 7 anos, impusemos uma taxa real de equilíbrio à custa de um aumento da
taxa nominal de juros que reduziu o nível de atividade e
impôs custos imensos à dívida pública.
Aliás, os números "dos outros países" variam de uma taxa de equilíbrio entre menos 2
(faz fisicamente sentido?) a
17% (é do Peru!). Na realidade
não informam nada. A "taxa
neutra" só pode ser encontrada no "toque", como faziam os
velhos obstetras...
ANTONIO DELFIM NETTO escreve às
quartas-feiras nesta coluna.
contatodelfimnetto@terra.com.br
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