São Paulo, sábado, 06 de novembro de 2010

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De volta ao passado

Depois de Dilma acenar com alívio nos tributos, governo e aliados tentam reabilitar a CPMF, sob a alegação de que faltam recursos para a saúde

A principal derrota do presidente Lula no Congresso em seus oito anos de mandato foi o fim da CPMF, em dezembro de 2007. De lá para cá ele não perdeu oportunidades de culpar a oposição pelo que seria a irresponsabilidade de deixar a saúde sem dinheiro.
Depois de alguns balões de ensaio frustrados nos últimos anos, o presidente voltou à carga logo na primeira entrevista pós-eleição, ao lado de sua sucessora, Dilma Rousseff. Antes mesmo que tivesse secado a tinta de seu primeiro discurso, em que pregara alívio nos tributos, a presidente eleita mostrou-se sensível à ideia de restaurar a taxa -embora tenha dito que não tomaria essa iniciativa.
Rapidamente surgiram aliados a sugerir a restauração do tributo. A primeira pergunta a ser feita é: falta dinheiro para a saúde a ponto de se justificar a recriação da taxa, com o nome de Contribuição Social para a Saúde (CSS)? A resposta é não. A emenda constitucional 29, aprovada em 2000, garantiu recursos crescentes para a área quando indexou as despesas ao crescimento do PIB nominal.
Entre 2002 e 2009, os gastos com saúde nos três níveis de governo cresceram de R$ 55 bilhões (3,7% do PIB) para R$ 166 bilhões (5,3% do PIB), o que representa uma alta de 93% em termos reais (ajustada pela inflação).
No plano federal, com gastos de R$ 58 bilhões em 2009, o crescimento chegou a 46% no mesmo período. Foi, portanto, nos Estados e municípios que as despesas aumentaram mais, ultrapassando 100%. O fim da CPMF em nada afetou esse movimento.
Formalmente, a criação da CSS -com alíquota de 0,10% e arrecadação prevista de R$ 15 bilhões ao ano- está estipulada no projeto de lei complementar 306, atualmente em tramitação na Câmara, que regulamenta a emenda 29. É sabido que vários governadores -talvez a maioria, incluindo os de oposição- apoiam a CSS. Movem-se pela vontade de obter mais recursos para fazer frente ao endurecimento nas regras de vinculação de despesas previsto no projeto ou de negociar com o governo federal uma divisão de atribuições que lhes seja mais vantajosa.
Um exemplo é o governador eleito de Minas, Antonio Anastasia, que se pronunciou a favor, dizendo que a demanda de recursos para a saúde é "infinita". Sem dúvida. O mesmo pode-se dizer de educação, segurança, infraestrutura e tantas outras.
Os recursos, porém, não são infinitos. À luz dos números acima, a prioridade deve ser assegurar o bom uso dos consideráveis recursos já garantidos por lei. Gestão eficaz, combate a lobbies que superfaturam custos e iniciativas inteligentes que melhorem o relacionamento entre vários níveis de governo e com a iniciativa privada são exemplos do que pode ser feito para melhorar os serviços.
Compreende-se que governantes queiram mais e mais recursos, mas em vez de apoiar a volta de uma taxa que pouco mudará o padrão de financiamento da saúde, seria melhor que se empenhassem em aumentar a eficiência da máquina pública para que empresas e contribuintes pudessem se ver aliviados do peso desmedido de nosso sistema tributário.


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