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São Paulo, domingo, 06 de dezembro de 2009 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES O novo "college"
NAOMAR DE ALMEIDA FILHO
ESTIVE EM Boston para um seminário na Universidade Harvard sobre meu tema de pesquisa, desigualdades em saúde. Aproveitei a viagem para visitar programas e assinar acordos com universidades da Costa Leste. Em palestras e encontros, discutimos o Reuni e seu impacto na universidade pública brasileira, agora talvez mais aberta à internacionalização. Percebi grande interesse no modelo UFBA Universidade Nova e no regime curricular do bacharelado interdisciplinar (BI), sobretudo por suas perspectivas de compatibilidade com o modelo do "college". Porém, muito fascinava nossos parceiros o que para eles parecia ser um caso de pioneirismo e sucesso (mitos heroicos parecem atrair os gestores acadêmicos das poderosas universidades americanas). Contei como a experiência do BI tem extrapolado nossas expectativas mais positivas. Por um lado, permitiu à UFBA implantar um projeto Reuni ambicioso e inovador, com massiva ampliação da graduação, de 4.200 vagas em 2007 para 7.916 em 2009, principalmente cursos noturnos. Por outro lado, constatamos inesperada aceitação em relação aos novos cursos. A primeira oferta de novas modalidades de graduação (ano passado) teve mais de 5.000 candidatos para 980 vagas. O BI de saúde recebeu 12 candidatos por vaga, e a procura pelo BI de ciências & tecnologias superou quase todas as engenharias. Neste ano, em processo seletivo recorde em toda a história de nossa instituição, cerca de 14 mil postulantes optaram por 1,4 mil vagas nas novas modalidades de ensino. Entre os 10 cursos mais concorridos, 5 são BIs ou cursos tecnológicos. O BI de humanidades tem maior concorrência que direito, administração e comunicação. O curso de gestão social é tão procurado quanto o de medicina, com mais de 34 candidatos/vaga, enquanto o BI de saúde, mesmo duplicando a oferta de vagas, é o terceiro curso mais concorrido, com 21 candidatos/vaga. No aeroporto de Nova York, confiro manchete da "Newsweek": "A reinvenção da educação superior". Quatro reitores e dois pesquisadores em educação discutem o papel do "college", a necessidade de torná-lo mais contemporâneo e, ao mesmo tempo, recuperar sua função pedagógica. A matéria central da revista é um artigo do senador Lamar Alexander, ex-ministro da Educação dos EUA, defendendo a redução do "college" de quatro para três anos. A favor da proposição, dois argumentos: aumento da eficiência com redução de custos sociais e renovação curricular com universalidade da formação. A proposta indica insatisfação com modelos atuais de educação superior diante da complexidade e diversidade cultural do mundo contemporâneo. Na tradição intelectual estadunidense, há quase consenso de que a educação superior constitui o mais legítimo meio de ascensão social. Talvez por isso, nossos interlocutores apreciam o fato de que a Universidade Nova tem matriz interdisciplinar, articula-se com programas de ação afirmativa e o BI compreende, ele próprio, instrumento de inclusão social. Para Sherman Garnett, "dean" do prestigioso James Madison College da Michigan State University, onde assinamos convênio de intercâmbio acadêmico, o modelo do BI pode superar o clássico "college" não só por ser mais econômico mas também por fomentar interdisciplinaridade e resgatar a missão civilizatória na universidade. Só para relembrar, Boaventura de Sousa Santos há tempos fez o mesmo comentário ao comparar o BI com o bacharelado europeu. Nessas bases, também iniciamos colaboração entre a Steinhardt School of Culture and Human Development da New York University e o novo Instituto de Humanidades, Artes e Ciências Milton Santos da UFBA, integrando currículos em programas conjuntos de formação interdisciplinar nas áreas de saúde, artes e humanidades. Dois séculos de história do sistema universitário anglo-saxão teriam mesmo desgastado o importante elemento de integração social e cultural de povo e nação, estruturante do projeto original da universidade humboldtiana? Será que o novo "college", mais curto e menos especializado, agora apresentado como alternativa ao bachelor de Bolonha, vai ao encontro do bacharelado interdisciplinar? Poderá a "onda brasileira" de desenvolvimento solidário, neste momento tão visível e valorizada no cenário político e econômico mundial, contribuir para a internacionalização da educação superior com modelos criativos de inclusão social com qualidade acadêmica? NAOMAR DE ALMEIDA FILHO , 57, doutor em epidemiologia, pesquisador 1-A do CNPq, é reitor da UFBA (Universidade Federal da Bahia). Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES Joaquim Falcão: O Supremo: um mal-estar Próximo Texto: Painel do Leitor Índice |
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