São Paulo, segunda-feira, 06 de dezembro de 2010

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Progressos recentes na infecção por HIV

VICENTE AMATO NETO e JACYR PASTERNAK


Continuamos otimistas: em relativamente pouco tempo, os avanços transformaram uma doença rapidamente fatal em crônica e controlável

Neste ano, tivemos progressos reais na luta contra a Aids. Pela primeira vez uma vacina mostrou alguma atividade profilática.
Claro que, na forma como ela está, hoje, não se presta ao uso clínico. Não se recomenda nenhuma vacina que proteja apenas 40% a 50% dos que a tomam, mas é a abertura de caminho, porque todas as tentativas vacinais que a antecederam não mostraram nenhuma eficácia.
Também é auspiciosa a descoberta de alguns anticorpos antivirais, anti-HIV, capazes de neutralizar número grande de cepas virais, incluindo vários genótipos do vírus. Isso permite imaginar que é possível desenvolver protetores de amplo espectro -pelo menos contra a maior parte das cepas.
Consideramos ainda melhor a descoberta, finalmente, de um gel vaginal contendo o tenofovir, o que dá uma razoável proteção contra a transmissão do HIV. Por razões culturais e de poder, mulheres submetem-se a sexo inseguro, com parceiros que não usam a camisinha. O uso de um gel com exclusivo controle pela mulher permite limitar a progressão da epidemia.
Experiências estão sendo feitas para avaliar se terapêutica profilática -tomar medicação retroviral logo após relação sexual possivelmente de risco ou até antes desta- podem ser proveitosos para limitar a expansão da epidemia.
Alguns dados sugerem que isso é válido, mas problemas logísticos, educacionais e financeiros precisam ser bem avaliados antes de tornar essa prática rotineira. Na verdade, em relação de risco, o aproveitamento de preservativo já é método suficientemente conhecido e testado: a pergunta que fica é por que precisamos de outros.
Investigações recentes mostram que é possível alguma proteção para evitar a infecção pelo HIV usando profilaxia medicamentosa. Claro que isso não deve substituir os clássicos métodos de barreira, como a camisinha, ou mesmo os novos métodos, como o gel vaginal.
Apesar de, nos trabalhos até agora feitos, não ter havido seleção de vírus resistentes às drogas, isso provavelmente vai acabar acontecendo e pode levar à perda de medicamentos úteis para o tratamento.
Finalmente, precisamos enfrentar o fato de que a infecção pelo HIV motiva doença tratável, e que os enfermos vão viver um longo período no qual o mal vai ser controlado, desde que respeitem as receitas de maneira adequada.
No entanto, percebemos que tais pacientes acabam desenvolvendo patologias que não eram relacionadas à infecção, mas que provavelmente são diretamente relacionadas ou potencializadas por ela. Ainda assim, continuamos otimistas com os progressos médicos que transformaram em relativamente pouco tempo uma doença rapidamente fatal em uma doença crônica e controlável.
Para o futuro, desejamos contar com vacina preventiva dotada de propriedade indiscutível ou com produto que atinja o vírus com cabal intensidade. Assim, não precisaremos mais implorar por mudanças de comportamento, dificilmente conseguidas.

VICENTE AMATO NETO, 83, médico especialista em clínica de doenças infecciosas e parasitárias, é professor emérito da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
E-mail: amatonet@usp.br
JACYR PASTERNAK, 70, médico especialista em clínica de doenças infecciosas e parasitárias, é doutor em medicina pela Unicamp.
E-mail: jpaster@einstein.br

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