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Curral de luxo
A disputa pela presidência da Câmara dos Deputados se dá em clima de desprezo pela opinião pública
ARRASTA-SE , no limbo do
recesso parlamentar, a
disputa entre os deputados Aldo Rebelo (PC
do B-SP) e Arlindo Chinaglia
(PT-SP) pela presidência da Câmara dos Deputados.
É comum comparar-se a uma
novela todo enredo que não ata
nem desata, mas cabe convir que
a teledramaturgia brasileira sabe
proporcionar ao espectador alguns instantes esporádicos de
emoção, imagens de certo apuro
estético e mesmo rudimentos de
moralidade que a tediosa e travada pugna entre os dois parlamentares da base governista está
longe de ostentar.
Não poderia ser outro o efeito
de uma trama cujos personagens
se desinteressam totalmente de
dar satisfações à opinião pública.
Tudo se passa como se estivéssemos diante das eleições para a diretoria de um grêmio recreativo
numa cidadezinha longínqua do
interior, e não traçando o perfil
que terá o centro do poder legislativo do país.
Num Congresso desmoralizado por uma seqüência, talvez
inédita na história, de escândalos e desmandos, nem um nem
outro candidato parece disposto
a fazer da recuperação da ética
parlamentar um tema relevante
de campanha.
Na verdade, foi bem o contrário disso que se viu quando Aldo
Rebelo, presidindo a Câmara e já
postulante à reeleição, advogou
com a impavidez de costume um
aberrante aumento salarial de
91% para seus pares. São estes,
afinal, os eleitores que contam
no momento; não aqueles que,
com seus impostos, haveriam de
pagar pelo piquenique.
É que o confronto se dá "interna corporis". Prevalecendo o voto secreto na eleição para a presidência da Câmara, trata-se de
atender apenas aos interesses
menos públicos de um eleitorado reduzido, ávido de privilégios
novos e assegurado na sua impunidade costumeira. Aqui, como
em qualquer outra deliberação
do Parlamento, somente o voto
aberto poderia garantir um mínimo de controle republicano ao
desfecho do episódio.
À falta de qualquer transparência decisória prevalecem o
populismo paroquial, a demagogia entre compadres, o curral de
luxo: o público ao qual se acena
com promessas não mais corresponde às "massas excluídas",
termo de saudosa memória no
vocabulário destes dois antigos
próceres da esquerda, mas, sim, a
esse insaciável lumpesinato de
gravata que hoje atende pelo nome de baixo clero.
Nada mais sintomático do descompasso entre os sentimentos
da opinião pública e as movimentações da dupla favorita do
que a idéia, aventada recentemente, de lançar-se uma "anticandidatura" para a Presidência
da Câmara. Sabendo-se com reduzidas chances de sucesso eleitoral, a iniciativa viria pelo menos a expressar aspirações de renovação ética no Congresso.
Um imperativo urgente na democracia brasileira se vê confinado, assim, ao plano das virtualidades e dos atos simbólicos de
protesto. Na vida real, enquanto
isso, Rebelo e Chinaglia evoluem
no seu patético "pas de deux". Já
houve algumas danças mais animadas no salão.
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