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TENDÊNCIAS/DEBATES
Deve-se admitir a exploração de madeira nas Florestas Nacionais?
SIM
Flonas para uma Amazônia florestal
ADALBERTO VERÍSSIMO
O debate sobre as Flonas (Florestas Nacionais) é oportuno no momento em que se discutem modos de
conciliar desenvolvimento e conservação dos recursos naturais da Amazônia.
Entretanto, para que isso ocorra de forma qualificada, é importante recolocar
com clareza os conceitos, os fatos e a importância estratégica dessas unidades
de conservação para o futuro da Amazônia.
Inicialmente, é preciso considerar o
dilema da Amazônia ao discutir o papel
das Flonas. A ocupação baseada na
agropecuária é a grande ameaça ao futuro da floresta amazônica. Atualmente, 15% da Amazônia legal já foi desmatada, e as projeções mais recentes sugerem que a abertura de estradas e a expansão da agropecuária poderão provocar o desmatamento de quase metade
da Amazônia até o ano 2020.
Para evitar esse colapso ecológico, é
essencial adotar medidas que conciliem
conservação e desenvolvimento sustentado. Primeiro, é urgente assegurar a
preservação das áreas de alto valor biológico, através da expansão das terras
indígenas, parques, reservas biológicas,
Florestas Nacionais, reservas extrativistas e outros tipos de unidades de conservação -o que poderia proteger 50%
da Amazônia (atualmente, apenas 30%
está protegida). Segundo, é crucial
apoiar o uso racional das florestas sob
domínio privado (35% do território),
através da adoção do manejo florestal
sustentável. Finalmente, é essencial promover a recuperação das áreas degradadas e a intensificação da agricultura nas
áreas desmatadas (cerca de 15%).
Na cesta de soluções para a manutenção da cobertura florestal, as Flonas têm
um papel de destaque. De acordo com a
legislação brasileira, as Flonas são uma
categoria de unidade de conservação,
com cobertura florestal de espécies nativas, cujo objetivo básico é o uso racional
dos recursos florestais sob regime de
manejo sustentável. Atualmente, as Flonas cobrem apenas 2% da Amazônia.
De acordo com as metas do Programa
Nacional de Florestas, as Flonas deverão
representar 500 mil km2 da Amazônia
-ou 10% do território- até 2010.
As Flonas têm uma função estratégica
para a promoção do manejo florestal,
pois asseguram oferta de produtos florestais manejados. Além disso, elas podem deter "grilagem" de terras públicas
na fronteira amazônica, capturar renda
da floresta pelo pagamento de royalties
e conservar a biodiversidade, uma vez
que podem ser uma zona-tampão ao redor dos parques e reservas, além de proporcionar corredores para o movimento de espécies. As Flonas podem contribuir também para a estabilidade econômica na Amazônia, por meio da restrição às atividades predatórias, do limite
à disponibilidade de terras, do aumento
do valor da terra e do incentivo à intensificação de seu uso.
Por último, a criação estratégica de
Flonas, por exemplo, nas margens das
rodovias a serem asfaltadas, pode reduzir os impactos negativos de programas
de abertura de estradas.
Do ponto de vista da conservação biológica, as Flonas são um complemento
essencial para a proteção de parques
dentro de uma estratégia global de conservação. A proteção de regiões de alta
importância biológica requererá a criação de um mosaico de áreas de conservação que devem combinar Flonas (uso
sustentável) com parques e reservas
biológicas (áreas de proteção integral).
Enquanto a estratégia de criação de
uma extensa rede de Flonas tem avançado, os desafios de sua implementação
estão apenas começando. Por exemplo,
a discussão efetiva sobre sistema de
concessão deve incluir temas como lisura e transparência do processo, oportunidades para as populações locais e capacidade gerencial do governo. Além
disso, será importante discutir formas
de compensação ou repartição dos benefícios da utilização das Flonas com os
governos e comunidades locais.
Há apoio político expressivo para a
expansão da área de Flonas na Amazônia. Porém sua implementação será repleta de desafios, os quais devem ser enfrentadas com coragem e competência.
Por outro lado, a dinâmica de ocupação
e exploração predatórias e ilegais poderá continuar vigorosamente na fronteira amazônica. Portanto a viabilidade da
criação de Flonas depende de medidas
emergenciais para ganhar tempo, como
o combate à grilagem de terras.
No curto prazo (três a quatro anos), o
governo deveria priorizar experiências-piloto de manejo nas Flonas, ao mesmo
tempo em que ampliaria a criação dessas unidades. Nesse intervalo, a maior
parte delas deveria ser mantida como
reserva estratégica para manejo no médio e no longo prazo, quando as condições de governabilidade forem mais favoráveis a uma experiência em larga escala.
Adalberto Veríssimo, 37, mestre em ecologia
pela Universidade Estadual da Pensilvânia (EUA),
é pesquisador sênior do Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia).
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