São Paulo, segunda-feira, 07 de junho de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

TENDÊNCIAS/DEBATES

Só depende de vontade política

GUILHERME AFIF DOMINGOS

A presentamos ao presidente da República, no dia 3 de maio, proposta para criar a figura do empreendedor pessoa física, a fim de permitir que todo indivíduo que produza bens ou preste serviços em escala reduzida possa fazê-lo na formalidade, sem ter de constituir uma empresa.
Essa proposta se fundamenta no parágrafo único do artigo 170 da Constituição, que estabelece que "é assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei". Na prática, contudo, esse dispositivo é anulado por uma legislação que obriga à criação de empresa, com toda a burocracia e o ônus decorrentes para quase todas as atividades -ou se tributa de forma excessiva o trabalhador autônomo, tornando letra morta o princípio constitucional. Em conseqüência, inúmeras atividades são exercidas na informalidade, com todos os custos que isso acarreta, tanto para os empreendedores e trabalhadores envolvidos como para o Estado e a sociedade.
Em um país que precisa gerar empregos -ou, pelo menos, ocupação e renda- para um imenso contingente de sua população, é necessário estimular a iniciativa individual, seja do trabalhador que busca sua subsistência, seja do empreendedor que deseja desenvolver uma atividade simples que pode lhe garantir um rendimento e, ainda, oferecer empregos, sem recorrer à informalidade. O que se propõe é que o empreendedor faça uma inscrição simplificada em um único órgão, o que lhe asseguraria a formalização e lhe permitiria emitir nota fiscal simplificada, que serviria de base para a escrituração do livro-caixa e recolhimento do Imposto de Renda como pessoa física, o único tributo a que estaria sujeito. Recolheria a contribuição individual ao INSS e poderia ter empregados, que também recolheriam sua contribuição e teriam direito ao 13º, férias e aviso prévio.
O limite para o faturamento poderia ser de R$ 60 mil anuais (equivalente a R$ 5 mil mensais), a partir do qual seria criada a empresa enquadrada no novo Simples, previsto na emenda constitucional da reforma tributária.
Seria uma versão básica do SuperSimples aplicada às pessoas físicas e que teria o importante papel de trazer para a formalidade um imenso contingente de atividades, como serralheiros, marceneiros, artesãos, costureiras e muitas outras de produção de bens; o pequeno comércio, inclusive ambulantes regularizados; e uma vasta gama de prestadores de serviços, como barbeiros, encanadores, eletricistas, chaveiros, vendedores, corretores etc. Atividades essas que, hoje, ou são desenvolvidas por empresas, ou na total informalidade.


O Brasil dispõe de um vasto potencial de empreendedorismo, o qual vem sendo sufocado pela burocracia
Se a criação do empreendedor pessoa física permitir a formalização de metade dos trabalhadores informais com renda superior a um salário mínimo mensal, teremos 9,3 milhões de contribuintes adicionais para o INSS, o que significa aumento de 31% de seu número e um considerável reforço de caixa para a Previdência.
Em 2002, segundo dados do IBGE, havia 31 milhões de pessoas com rendimentos que totalizavam R$ 317 milhões de renda no mercado informal, o que demonstra a importância de estimular a formalização dessas atividades.
É evidente que somente ocorrerão a formalização das atividades e o surgimento de novas iniciativas se o seu custo for inferior às desvantagens da informalidade. O Brasil dispõe de um vasto potencial de empreendedorismo, baseado na capacidade individual de sua população, o qual vem sendo sufocado pela burocracia e pela tributação.
Sem prejuízo de um amplo programa de desburocratização fiscal, que inclui necessariamente a revisão da legislação trabalhista, visando flexibilizá-la e adaptá-la à nova realidade da economia, é preciso criar novas formas de geração de renda, ocupação e emprego, valorizando a iniciativa individual, conforme assegurado pela Constituição, para que o país possa encontrar o caminho do desenvolvimento econômico e social. Só depende de vontade política.

Guilherme Afif Domingos, 60, empresário, é presidente da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) e da Federação das Associações Comerciais de São Paulo (Facesp). Foi deputado federal pelo PFL-SP (1987-91).


Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES
Zilda Arns Neumann: Medicamentos para o povo

Próximo Texto: Painel do Leitor
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.