São Paulo, quarta-feira, 07 de julho de 2004

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CARLOS HEITOR CONY

Do outro lado

RIO DE JANEIRO - Em recente documentário sobre o tráfego aéreo, fiquei sabendo que a tecnologia se desenvolve em progressão geométrica, enquanto o elemento humano, baseado em terra, progride pouco e, quando progride, o faz em progressão aritmética. Em linhas gerais, o mesmo ocorre em outros setores, sobretudo no da medicina, que, dia-a-dia, avança assombrosamente sobre as doenças, as pesquisas e os equipamentos, não apenas melhorando a qualidade mas aumentando a expectativa de vida de todos nós.
Contudo o elemento humano continua mais ou menos na mesma, sujeito ao estresse, a equívocos operacionais e até mesmo a certa tecnicidade que o transforma mecanicamente num operário que manipula instrumentos, laudos, medicamentos e estatísticas.
A tecnologia e a ciência praticamente já garantem um tipo de vida quase eterna. Monitorado, congelado, reduzido ao seu complexo químico e biológico, o ser humano, se não chegou ainda a ser imortal, mesmo sem entrar para a ABL, pode viver indefinidamente, dentro de circunstâncias determinadas pela técnica e pela ciência.
No entanto o entorno da moderna medicina tem alçapões que são considerados, profilaticamente, como "acidentes de percurso". É a infecção hospitalar, da qual nem os melhores centros médicos estão isentos, a troca de laudos e, algumas vezes, a troca de medicamentos, a carga horária dos profissionais de saúde que não podem ser substituídos por aparelhos e, em caso mais raros e lamentáveis, o puro, o elementar, o inevitável erro humano.
Acho gozado quando vejo um filme cuja história se passa em séculos remotos. Alguém adoece ou se acidenta, chamam o médico, que vem, geralmente numa charrete, trazendo uma valise triangular, um termômetro e um relógio tipo cebolão para contar as batidas cardíacas do paciente.
Se eu vivesse naquele tempo, há muito já estaria do outro lado.


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