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JOSÉ SARNEY
Torcedor e candidato
ESTE ATRAVESSAR junho-julho tem sido um tempo de sofrimento. Para o povo brasileiro, a provação de ver a seleção de
ouro tornar-se pó sem fazer uma
partida que pudesse lembrar de leve o brilhante futebol brasileiro,
que encantava a todos nós e fez fama e escola pelo mundo inteiro. Os
"experts" -e eu não sou nem de leve um- dizem que tínhamos excelentes jogadores, mas que não tínhamos equipe. Para mim, é um
paradoxo, mas, para os entendidos,
faz sentido. Até torcedor sou contido e, às vezes, relapso em assistir às
partidas de maior impacto.
Mas ao nosso sofrimento juntou-se o de espanhóis, alemães e
portugueses, para não estender a
lista -restando a perspectiva da
coroa final da glória a França e Itália. Ao vencedor, repitamos Machado de Assis, as batatas.
Mas sofrimento, também não
dos menores, começa agora para os
candidatos aos postos eletivos. Não
é só a angústia de não se eleger,
mas a via-crúcis do emaranhado de
leis que enfrentam, desde o pedido
da documentação do registro até
ao que se pode e não se pode fazer.
Quando a gente lê toda ela, vê a que
ponto de desprestígio e desmoralização chegou a classe política. Detalha-se a lei de todo jeito -e é bom
e necessário- para não deixar portas nem frestas a coisas ruins. Parece mais um compêndio de como
defender-se das doenças nas cidades na Idade Média.
A primeira humilhação é que o
candidato deixa seu nome, passado, qualidades, marcas e virtudes
para ser simplesmente um número. A informática é um avanço, mas
esse negócio de transformar as
pessoas em número, que me parecia no passado coisa dos tiros-de-guerra (avança o 31, engatilha o 23
etc.), chegou à política. Eu, por
exemplo, a partir de agora, sou o
151, que é número que me foi dado
pela Justiça Eleitoral para ser candidato novamente a senador.
Quando estranhei isso, minha
mulher foi logo, com seu bom senso, me advertindo: "Não reclame.
Você perdeu o juízo depois de velho. Na sua idade ainda metido em
eleição". Fico calado e faço uma reflexão sobre o que ela está pensando: "Ficar em casa, caminhar, ver
televisão, escrever, ler e espoucar
bolinhas de plástico". Mas reajo como posso: "Ainda posso ser útil ao
país e não tenho temperamento
para essa folga toda, que deve ser
boa para gente nova, e não para velho. Estes são para trabalhar e se
preocupar. Deus não é representado como velho?". Nem aí eu tenho
razão, pois, até o Renascimento, ele
era representado como um jovem.
Mas humilhação mesmo de candidato foi quando me trouxeram
um papel para que eu declarasse
minha escolaridade. Não resisti e
escrevi: "Sei ler e escrever". Só Felipão e eu fomos mais que humilhados nestes dois dias.
jose-sarney@uol.com.br
JOSÉ SARNEY escreve às sextas-feiras nesta coluna.
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