São Paulo, terça-feira, 07 de agosto de 2007

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MARCOS NOBRE

Prisões

A INVISIBILIDADE é o ambiente ideal para a proliferação de organizações criminosas. Autoridades do governo do Estado de São Paulo insistiram durante anos em negar a existência do PCC até a grande onda de rebeliões de 2001. Em 2006, o PCC mostrou que tinha organização e meios suficientes para assassinar agentes públicos e paralisar toda a cidade de São Paulo. As respostas por parte do poder público foram uma onda de violência policial que resultou na morte de quase cem civis em pouco mais de uma semana e no aumento das transferências e do isolamento de presos.
Nesses momentos, o debate público tira as prisões da sombra, e a sociedade se vê confrontada com um espelho de si mesma. A imagem não é nem um pouco confortável. Faz pensar nas regras de exclusão de membros que cometeram crimes e em como são tratados nesses regimes de privação de liberdade. O problema é que esse assunto só é discutido em situações emergenciais e de pânico. No caso dos ataques de 2006, a sociedade não reconheceu essa sua imagem no espelho. Ficou aliviada por vê-lo tirado da sua frente. Tudo parece calmo novamente. As prisões voltaram a ser invisíveis. No entanto, os números insistem em desafiar essa aparente calmaria. Entre 1995 e 2007, em valores aproximados, o número de presos subiu de 68 mil para 320 mil.
Nesse mesmo período, o número de encarcerados por 100 mil habitantes saltou de 74 para 183. O déficit de vagas no sistema prisional está hoje próximo de 130 mil. Isso mostra que a resposta habitual -penas mais severas e mais longas- não conseguiu até agora resolver o problema. Esses números mostram o preço social da estabilização brasileira. A superlotação das prisões é a outra face do Real e do modelo de desenvolvimento que inaugurou. As exportações e o investimento externo continuam crescendo na mesma proporção do aumento da violência. A desigualdade não cede senão em alguns milímetros. É possível tirar as prisões da invisibilidade, tornando o tema parte permanente do debate público.
Presos são cidadãs e cidadãos brasileiros que, além de privados de liberdade, são também privados de seus direitos políticos. Não podem votar. Se pudessem, a sociedade seria obrigada a ouvir o que têm a dizer. Hoje, o único canal de expressão que têm é a manipulação por parte de organizações como o PCC. É possível que uma eventual concessão do direito de voto aos presos venha a ser manipulada também. É possível que o resultado não seja nem um pouco bonito de ver. Mas o que não adianta é achar que a culpa é do espelho.


MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras nesta coluna.


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