São Paulo, sexta, 7 de agosto de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Contrato de risco

ELIANE CANTANHÊDE

Brasília - No pacote trabalhista que anunciou ontem, o governo incluiu uma medida provisória regulamentando o "trabalho a tempo parcial".
Significa a possibilidade de contratos de jornada reduzida, com salário, férias, 13º e outros benefícios proporcionais. Ou seja, menores.
Justificativa oficial: aumentar a oferta de empregos, especialmente para os jovens que estudam e para as mulheres que têm filhos pequenos.
Temor geral: que os favorecidos não sejam os trabalhadores, mas os patrões. Eles podem reduzir contratualmente salários e benefícios, mantendo na prática as mesmas e suadas horas.
O temor é mais do que justificado, porque a correlação de forças sempre favoreceu os patrões e agora mais ainda. O desemprego chega a 7,9% (taxa do IBGE para junho) e não há previsão de significativas quedas de juros ou outras medidas macroeconômicas que dêem um refresco.
FHC presidiu a solenidade de anúncio do pacote ladeado por cinco ministros. Em discurso, justificou que o Brasil de hoje (e junto com ele o seu governo) é vítima de um "gargalo".
Explicou: as taxas de natalidade vêm diminuindo (estão entre 1,2% e 1,3%), mas é justamente agora que chegam ao mercado de trabalho os jovens nascidos há 20 anos, quando a natalidade batia em 3%. Juntem-se a eles as mulheres, que já passam de 40% da força de trabalho.
Tudo muito bom. Mas a redução da jornada, justificada pela necessidade de garantir renda a mulheres e jovens, é um paliativo e deixa dúvidas.
Uma é formal. Por que editar uma MP criando o que fora criado antes? Segundo o ministro Edward Amadeo, foi "simplesmente para esclarecer as empresas, para elas fazerem o que já era permitido".
Outra, real. Por que não foram estabelecidos limites percentuais para os empregados de jornada reduzida? De uma tacada, um patrão poderá reduzir o horário de trabalho -e a folha de pagamentos- de toda a empresa.
"É um risco", admitiu Amadeo. Resultado: só nos resta rezar.



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.