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ANTONIO DELFIM NETTO
Compromisso moral
FEZ MUITO bem o presidente
Lula de intervir, pessoal e urgentemente, no trágico episódio do "racionamento" físico do
fornecimento de gás. Ele não pode
dizer que "não sabia" -como disse
FHC quando surpreendido pelo
apagão elétrico que cobrou 2% do
PIB em 2001.
Em 2004, o governo iniciou, por
meio da Petrobras, a política de estimular o setor privado a substituir
sua energia por gás. Foi concedido
um subsídio escondido no preço e
uma diferenciação tributária que o
transformou, artificialmente, na
melhor alternativa energética para
alguns cidadãos (os taxistas, por
exemplo, que transferem parte para os passageiros) e para algumas
indústrias.
O "mercado", acreditando no governo, aumentou a demanda da
energia que lhe proporcionava
uma vantagem. Era sabido, portanto: 1º) que a demanda de gás iria
crescer; 2º) que, para supri-la, seria
preciso antecipar o aumento da
oferta e 3º) que qualquer diferença
de velocidade no crescimento da
demanda e da oferta só poderia ser
corrigida por um racionamento "físico" (como aconteceu) ou por um
racionamento pelo "preço" (que
está para acontecer, como disse,
aliás corretamente, o doutor Gabrielli).
As dúvidas do setor privado sobre a capacidade da Petrobras de
fornecer todo o gás que prometeu
são antigas: havia suspeita (agora
confirmada) de que ela estivesse
num estado "quântico", quando algumas pessoas acreditam ser possível destinar a mesma molécula
para dois usos diferentes...
Quando, por exigência do Operador Nacional do Sistema Elétrico
(ONS), teve de cumprir o compromisso com as usinas a gás, ela eliminou o excedente que vinha fornecendo acima dos contratos para
as distribuidoras estaduais, em nome do louvável e absolutamente
certo princípio de que "tinha de
honrar os contratos".
Como ninguém pode exigir-lhe
que faça o fisicamente impossível
(suprir gás de que não dispõe), empurrou sobre as distribuidoras a
obrigação de assumir o racionamento. O problema é que a desculpa é correta, mas inaceitável.
A verdade nua é que o governo
assumiu, por intermédio da Petrobras, um compromisso moral (tão
forte quanto os escritos que ela está honrando) com os ingênuos cidadãos que aceitaram a sua palavra
como boa.
Paga agora o vexame de tê-los
decepcionado por conta do comportamento insensato e inconfiável do "companheiro" andino, com
quem vai ter de acertar-se mais
uma vez...
contatodelfimnetto@uol.com.br
ANTONIO DELFIM NETTO escreve às quartas-feiras
nesta coluna.
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