São Paulo, quinta-feira, 07 de dezembro de 2006

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Editoriais

O caos como rotina


No terceiro colapso aéreo seguido, fica patente a incapacidade do governo de resolver a crise e de dar satisfação a passageiros


É DE estranhar muitíssimo a ocorrência de uma pane inédita no sistema de controle de vôos de Brasília neste momento. Ou está em curso uma conspiração cósmica contra os usuários do transporte aéreo no país, ou essa trama tem contornos bem mais mundanos.
Ressaltam, após o terceiro episódio de colapso aéreo em menos de dois meses, a incúria, a desarticulação e a incompetência das autoridades responsáveis pelo setor. Ministério da Defesa, Comando da Aeronáutica, Infraero, Agência Nacional de Aviação Civil; a resultante da ação de quatro instâncias da burocracia tem sido nula quando se trata de debelar a crise na raiz, dar satisfação em tempo real aos prejudicados e minimizar o desconforto dos passageiros.
Se o caos ameaça tornar-se rotina nos aeroportos, é preciso nomear os quatro cavaleiros do desgoverno. Cinco, refazendo a conta, pois a blandícia e a passividade do chefe do Executivo federal perante o escalar da crise alçam o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com a indolência de sempre, ao topo da lista.
Compreende-se que os controladores de vôo tenham ficado aborrecidos e até traumatizados após o acidente que matou 154 pessoas em 29 de setembro. Daí não se justifica, no entanto, a liberdade com que foram brindados pelo governo para levar adiante um movimento de rebelião -contra a hierarquia militar- e sabotagem -contra o transporte aéreo nacional.
Também é natural que provenha dos controladores um lobby para tirar a operação do tráfego aéreo das Forças Armadas e entregá-la a agências civis. Os servidores pleiteiam, contra o interesse dos usuários, ver formalizado seu poder de paralisar os aviões sempre que desejarem pressionar o governo a atender demandas corporativas -os "apagões aéreos" são apenas uma prévia do que seria o controle civil do fluxo de aeronaves.
Espantoso é Lula apoiar as ambições desse sindicato clandestino. O presidente chegou a incentivar a conversa que o titular da Defesa e seu colega do Trabalho tiveram com controladores militares, na ausência de oficiais a quem são subordinados, para tratar de uma pauta de reivindicações. Para completar, o presidente assistiu à queda de dois oficiais da Aeronáutica ligados ao controle de vôo -algo natural, pois não conseguiram evitar o colapso-, mas continua a respaldar Waldir Pires na Defesa. Além de ter liderado a condução sindicalista da crise, o ministro demonstra a cada declaração desconhecer informações elementares acerca dos acontecimentos. Fica patente sua falta de autoridade sobre os militares.
Coerente. Lula apenas premia o "só sei que nada sei" -na sua vertente oportunista, não na socrática-, lema que o presidente encarnou durante os escândalos de seu primeiro mandato.
Coerente, mas inaceitável. Ou o presidente da República corrige de imediato a rota no modo de lidar com a crise aérea, ou o seu governo ficará indelevelmente marcado como aquele que levou de vez o caos para a rotina dos aeroportos brasileiros.


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